10-9-2012

 

 

Pedro Serrão de Crasto (1650 - 1682), relaxado

 

Uma das maiores violências da Inquisição no séc. XVII, foi a prisão da família de António Serrão de Crasto. Foi ele preso em 1672 e logo no ano seguinte, prenderam três irmãs suas, três filhos, dois sobrinhos e uma prima. Por grande azar, a Inquisição ficou paralisada por ordem do Papa, mas todos os que estavam presos ficaram a “apodrecer” nas celas. Em 22 de Agosto de 1681, o Papa Inocêncio XI, publicou o Breve que repôs os Inquisidores nas suas funções e só então é que foram despachados os processos para irem todos ao auto da fé de 10 de Maio de 1682. Já tinha falecido no cárcere a irmã mais velha, Inês Duarte. Por desespero, tinham entrado no jogo de denúncias da Inquisição e acusaram-se todos uns aos outros, mais uns tantos cristãos novos que conheciam. Com uma excepção: o filho Pedro Serrão não quis denunciar a sua família e por isso foi garrotado e o seu cadáver queimado no auto da fé, apesar de na altura toda a gente o considerar um católico fervoroso. Os castigos dos outros foram os habituais. A filha Teresa Maria de Jesus e sua tia Paula de Crasto foram condenadas a degredo para o Brasil, mas a primeira escapou em atenção a doenças contraídas no cárcere e ao facto de ser “moça donzela” e a segunda certamente pela avançada idade que já tinha: cerca de 73 anos; a Inquisição responsabilizou por elas a António Serrão de Castro, cego e alquebrado (Pr. n.º 9796, img. 201). Mas o sobrinho Pedro Duarte Ferrão foi condenado também a degredo de 5 anos para o Brasil e foi para a Baía cumpri-lo, como se vê de uma declaração no processo de que ali fez a desobriga anual (confissão e comunhão) no ano de 1683.

Diz a filha Teresa Maria de Jesus, no final de 1683 : "ser seu pai um homem muito velho, cego, e seus irmãos estarem ambos faltos de juízo, e ser a sua pobreza tanta que se alimentam de esmolas, como é notório, sem ter com que poder aviar-se..."

Tem-se dito que a Inquisição tinha razão em prender a família, porque judaizavam, seja lá o que isso quer dizer. Vários membros da família e bastantes outros cristãos novos pertenciam à Academia dos Singulares, de que nos chegaram dois volumes de poesia barroca, de qualidade discutível. António Serrão de Crasto deixou depois muitos poemas em manuscrito entre os quais um longo poema chamado “Os ratos da Inquisição”, publicado em 1883, com um prefácio biográfico, por Camilo Castelo Branco. Em 2004, a Frenesi reeditou o livrinho e juntou-lhe outro poema mais sentido, com o título “Carta a Francisco de Mezas”, poesia menos cuidada, mas bastante mais expressiva que “Os ratos”. Nesta "Carta", Serrão de Crasto exprime convicções religiosas judaicas, o que não é de admirar, depois do que tinha sofrido às mãos dos Inquisidores. Haveria muita convivência na Academia entre os cristãos novos, mas acho asneira chapada dizer que era uma “sinagoga”. Afinal, aí estão os volumes das poesias para dizer de que é que lá se tratava.

Tenho, porém, de notar que, na família, tinha havido já muitos matrimónios mistos com cristãos velhos, o que indica uma vontade de se assimilarem com a população portuguesa. E estou convencido que a família já não faria cerimonias judaicas, nomeadamente jejuns, pelos menos a geração mais nova.

 

GENEALOGIA

 

LINHA MATERNA:

 

Paula de Crasto casou em primeiras núpcias  com Pedro Álvares e em segundas com Fernão Álvares, cristão velho, de Elvas e teve:

 

Do 1.º casamento

A- António Lopes, filho natural, casou em Sevilha com Ambrósia Neto, cristã velha,  natural de Coimbra, com quem teve

                    Catarina de Crasto (1673 - Pr. n.º 4433), viúva de Domingos da Silva, residente em Lisboa

Do 2.º casamento

B- Duarte de Crasto, casou com Isabel Gomes e tiveram

                    Luis de Crasto (1656 - Pr. n.º 8324) que casou com Francisca de Balboa  e tiveram 

                                        Isabel Balboa, casada em Lisboa com Bento Bravo da Silva (1676 – Pr. n.º 11267)

                    Manuel Gomes de Crasto, solteiro, de 40 anos,  ausente em Anvers, onde reside

                    Paula de Crasto, já defunta, que foi casada com António de França Rolim, Advogado também defunto

                    Francisca Serrã, já defunta que foi casada com seu primo António Serrão de Crasto e tiveram os filhos abaixo indicados

                    Maria de Gallegos, casada com Bartolomeu de Oliveira, Advogado, moradores no Rio de Janeiro e têm Ana, de 15 anos e Gaspar, de 10.

C- Francisca Nunes, que foi casada com Lopo Sanches e tiveram:

                    P.e Pedro Álvares, que foi  harpista, já defunto;

                    Diogo Álvares, que morreu solteiro

                    António Sanches, que foi harpista e faleceu solteiro

                    Paula de Crasto, que casou com Pedro Álvares, também defunta

                    Isabel Nunes que foi casada em Castela não sabe com quem

                    Filipa Nunes moradora na Corte de Madrid, não sabe se casou

                    Margarida Nunes, moradora em Lisboa, casada não sabe com quem.

 D- Maria de Crasto, casou com António Jorge, cristão velho, e tiveram:

                     António Jorge Bulhão, Clérigo do hábito de S. Pedro

                     Pedro Jorge, que morreu solteiro

                     Soror Jerónima dos Anjos e

                     Soror Francisca da Cruz, ambas religiosas professas no Convento de Sant’Ana da cidade de Lisboa

                     mais duas religiosas no Convento de Monforte, uma delas já defunta, das quais não sabe o nome

                     Mariana de Crasto casada duas vezes nesta cidade, a primeira vez com Manuel de Luna, cristão velho, depois casada com Nicolau Rodrigues.

E- Margarida de Crasto, que faleceu solteira

F- Pedro Serrão, que casou com Ana Francisca e tiveram:

                    Fernando Alvares, faleceu solteiro

                    Estêvão Rodrigues, faleceu solteiro

                    António Serrão de Crasto (1672 - Pr. n.º 4910), que casou com Francisca Serrã, já defunta, e teve

                                        Luis Serrão (1673 - Pr. n.º 7391), estudante de medicina, de 24 anos

                                        Pedro Serrão (1673 - Pr. n.º 9797), estudante de teologia, de 23 anos

                                        Teresa Maria de Jesus (1673 - Pr. n.º 4911; 1683 - Pr. n.º 4911-1), solteira, de 18 anos.

                                        Duarte de Crasto, estudante de Geometria, de 17 anos

                    Paula de Crasto (1673 - Pr. n.º 9796) casou com António Duarte Ferrão, cristão velho e tiveram

                                        Pedro Duarte Ferrão (1673 - Pr. n.º 8096) casado com D. Francisca Reboredo e Vasconcelos, cristã velha, e têm António, José, Manuel, Jacinta e Catarina, o mais velho com 8-9 anos.

                    Inês Duarte (1673 - Pr. n.º 7677), que nunca casou

                    Francisca Serrã (1673 - Pr. n.º 2756), viúva de Luis Bulhão, cristão velho, e tiveram

                                        Luis Bulhão, casado com D. Antónia Ferreira, cristã velha, não têm filhos

 

 

PROCESSO

fls. 1 img. 1 – Processo n.º 9797, de Pedro Serrão de Crasto, solteiro, estudante, filho de António Serrão de Crasto, natural e morador em Lisboa

fls. 4, img. 7 – 14-9-1673

Mandado de prisão com sequestro de bens

fls. 5 img. 9 – 20-8-1673

Não refere quem fez a prisão. Foram encontrados em poder dele um livro de horas de Nossa Senhora, um livro de meditação da Paixão de Cristo, uns Bentinhos da Trindade e S. Francisco, um cilício e disciplinas de aço, e uns bocadinhos de prata que foram engraze de contas.

fls. 6 img. 11 – 20-9-1673 – Planta do cárcere

Ficou numa cela na companhia de José Francisco.

CULPAS:

fls. 7 img. 13 – Depoimento de 12-9-1673 – Antónia Pestana – 1672 – Pr. n.º 250 -, casada com Francisco Manuel Delgado (1672 – Pr. n.º 11280), natural e residente em Lisboa – Há quatro anos em sua casa.

fls. 8 img. 15 – Dep. de 12-9-1673 – Filipa Pestana – 1672 – Pr. n.º 2599 – solteira, filha de Lourenço Pestana, natural e moradora em Lisboa – Há cinco anos em Lisboa, em casa de António Serrão de Crasto.

fls. 10 v img. 20 – Dep. de 9-12-1673 – Pedro Ribeiro, viúvo de Verónica Ferreira – 1672 – Pr. n.º 9076 -, natural e morador em Lisboa – Há dois anos, na cidade de Lisboa, na Rua dos Escudeiros, na botica de António Serrão de Crasto.

fls. 13 img. 25  Dep. de 16-9-1676 – Catarina de Crasto, viúva de Domingos da Silva, que foi músico – 1673 – Pr. n.º 4433-, natural de Sevilha-Espanha e residente em Lisboa. É segunda prima do réu. – Há dez anos em Lisboa, em casa de António Serrão de Crasto, boticário.

fls. 15 v img. 30 – Dep. de 1-4-1682 – sua tia direita Francisca Serrã, viúva de Luis Bulhão – 1673 – Pr. n.º 2756, natural e moradora em Lisboa – Há treze anos, em Lisboa, em casa de seu irmão António Serrão de Crasto.

fls. 16 v img. 32 -  Dep. de 17-4-1682 – sua tia direita Paula de Crasto – 1672 – Pr. n.º 9796 -, casada com António Duarte, natural e moradora em Lisboa – há 13 anos em sua casa.

fls. 18 img. 35 – Dep. de 18-4-1682 – seu primo direito Luis de Bulhão – 1672 – Pr. n. 7688 -, casado com D. Antónia Ferreira de Lemos, cristã velha – Há dez anos em Lisboa, em casa de seu tio, António Serrão de Crasto.

fls. 19 img. 37 – Dep. de 23-4- 1682 – seu irmão Luis Serrão – 1673 – Pr. n.º 7391 -, Bacharel formado em Medicina, solteiro, natural e morador em Lisboa – Há doze anos em Lisboa, em casa de seus pais.

fls. 21 img. 41 – 26-4-1682 – seu pai António Serrão de Crasto- 1672 – Pr. n.º 4910 – boticário, natural e morador em Lisboa – há treze anos, em sua casa.

fls. 23 img. 45 – 10-10-1673 – Termo de curador

O réu disse ter 23 anos. Foi nomeado seu curador, por ser menor de 25 anos, Agostinho Nunes, Alcaide dos cárceres secretos da Inquisição.

fls. 24 img. 47 – 10-10-1673 – Termo de inventário

Não tem bens de raiz e alguns móveis que poderia ter herdado por morte de sua mãe, estão na posse de seu pai.

fls. 25 img. 49 – Genealogia

Disse que não tem culpas que confessar. Quanto à genealogia:

Nome dos pais: António Serrão ou António Serrão de Crasto, viúvo de  Francisca Serrã

Avós paternos: Pedro Serrão, cristão velho, boticário e Ana Francisca, cristã nova, defuntos

Avós maternos: Duarte de Crasto, cristão velho, ourives  e Isabel Gomes, cristã nova, defuntos

 

Do Pai: Um tio e três tias: Fernando Alvarez, Paula de Crasto, Francisca Serrã e Inês Duarte

Fernando Alvarez faleceu solteiro, sem filhos

Paula de Crasto é casada com António Duarte, e têm Pedro Duarte Ferrão, casado com D. Francisca de Reboredo e Vasconcelos

Francisca Serrã é viúva de Luis do Bulhão e tiveram Luis do Bulhão, casado com D. Antónia Ferreira

Inês Duarte é solteira, de mais de 60 anos

 

Da Mãe: Dois tios e duas tias: Luis de Crasto (1656 – Pr. n.º 8324), já defunto, Manuel de Crasto, Paula de Crasto, defunta e Maria de Gallegos

 

Luis de Crasto (1656 – Pr. n.º 8324) foi fanqueiro, casado com Francisca de Balboa, de que tem Duarte, que faleceu de pouca idade e Isabel Balboa, casada nesta cidade com Bento Bravo da Silva (1667 – Pr. n.º 11267).

Manuel da Crasto é morador na Flandres, solteiro, de 40 anos.

Paula de Crasto foi casada com um Advogado e não tem filhos.

Maria de Gallegos é casada com Bartolomeu de Oliveira, Advogado, de quem tem Gaspar, de 10 ou 12 anos, Duarte que faleceu criança, Ana de 15 ou 16, solteiros, moradores no Rio de Janeiro.

Ele declarante tem dois irmãos e uma irmã, Luis Serrão, estudante de medicina, Duarte de Crasto, estudante de gramática, de 16 anos, e Teresa Maria de Jesus, solteira, de 18 anos.

fls. 28 img. 55 – 12-4-1674 – Sessão in genere

Respondeu negativamente a todas as perguntas sobre cerimónias e costumes judaicos.

fls. 30 img. 59 – 16-5-1675 – Termo de novo curador

Nomeado novo curador Valentim Correia da Silva, que serve de Alcaide dos cárceres secretos.

fls. 30 v img. 60 – 16-5-1675 – Sessão in specie

Perguntado em relação a cada um das denúncias, de que foi acusado, com omissão do lugar, do tempo e das pessoas presentes, respondeu a todas “Não passou tal”.

fls. 33 img. 65 – 22-5-1675 – Admoestação antes do libelo

fls. 34 img. 67 – Libelo

Interrogado no final da leitura, disse que contestava tudo por negação. Disse que queria vir com defesa e foi-lhe atribuído como Procurador o Licenciado Pedro Calado de Araújo.

fls. 36 img. 71 – 10-6-1676 – Termo de nova procuração

No impedimento do procurador nomeado, foi indicado como novo procurador o Licenciado João Lopes Tinoco.

fls. 36 v img. 72 - 16-6-1676 – Juramento do novo procurador

fls. 37 img. 73 – 16-6-1676 – Estância com o Procurador

fls. 38 img. 75 – Traslado do libelo

fls. 40 img. 79 – 20-6-1676 - Defesa escrita pelo procurador

Alegou três pontos:

1.O réu sempre viveu como bom católico. Vai à Missa em todos os dias de preceito e não só. Confessa-se todas as semanas ás quintas e aos domingos na Congregação do P.e Bartolomeu do Quintal (Oratoriano) onde passa a maior marte do eu tempo. Aos quartos domingos, vai a S. Roque à Comunhão geral e não falta aos Jubileus.

2.Ele e os seus discípulos da Congregação vão todas as quintas feiras à tarde ao Hospital dos entrevados de N.ª Sr.ª do Amparo, para limpar, varrer e para rezar e ensinar a doutrina cristã aos doentes. Por vezes, vão ao Hospital Real repartir doces com os doentes das enfermarias, ensinar-lhes o acto de contrição.

3.Que ele réu nunca ceia fora de casa. E que nunca fez os jejuns que lhe são imputados. E nunca recusou comer carne de porco, coelho ou lebre, se lho davam à mesa.,

Indicou testemunhas para cada um destes pontos, mas nem todos foram ouvidos.

fls. 41 img. 81 – 20-6-1676 – A defesa é recebida pelos Inquisidores

fls. 42 img. 83 – 24-3-1677 – Audição das testemunhas

- Jerónimo Gomes, violeiro, natural de Coimbra, morador em Lisboa, na Rua dos Escudeiros. Disse que Pedro Serrão é bom cristão e frequenta muito ao Congregação do P.e Quental. Sobre o terceiro ponto, nada sabe.

- Pedro da Rocha, barbeiro de espadas, natural e morador em Lisboa. Disse que o réu é bom cristão e faz os exercícios espirituais que é costume fazer na Congregação do P.e Quental. Sobre o ponto 3, sabe apenas que elevai de quando em quando a casa de Luis da Costa Pintor.

- Francisco Nunes, latoeiro, natural e morador em Lisboa. Disse que tem o réu em conta de bom cristão, que frequenta a Congregação do P.e Quental, que compra doces para os doentes do Hospital e que vai ajudar a fazer as camas. Quanto ao ponto terceiro, nunca o viu abster-se de comer aquelas coisas.

- Manuel Carvalho, latoeiro, natural e morador em Lisboa, no Largo da Caldeiraria. Disse que considera o réu bom cristão e que o vê frequentar a Congregação do P.e Bartolomeu de Quental e praticar os exercícios espirituais ali prescritos. Quanto ao ponto 3.º, viu comer o réu algumas vezes e nunca o viu abster-se de comer qualquer coisa que viesse para a mesa.

fls. 45 img. 89 – 24-3-1677 –

- Feliz da Costa, pintor, natural e morador em Lisboa, na Rua dos Calafates. Disse que tem o réu em conta de bom cristão, sobretudo por frequentar a Congregação do P.e Quental.

- Braz de Almeida, pintor, natural e morador em Lisboa, na Rua dos Calafates.  Disse que sempre viu o réu comportar-se como bom cristão e dar bons conselhos aos amigos.  Quanto ao ponto um, disse que é verdade, excepto no que respeita à confissão semanal, que não sabe. Quanto ao ponto 2.º, o réu disse-lhe isso de facto, mas não sabe se é verdade porque nunca viu.

fls. 47 img. 93 – 26-3-1677 –

-  P.e Bartolomeu do Quental, da Congregação do Oratório, de 49 anos. Conhece o réu há 8 ou 9 anos, por frequentar a Congregação do Oratório. Tem o réu na conta de muito bom cristão, pelos exercícios religiosos que faz na Congregação.  Confirmou o arguido nos pontos 1.º e 2..º

- P.e João Lobo, da Congregação do Oratório – Testemunho totalmente idêntico ao anterior.

fls. 49 img. 97 – 23-6-1676 – Requerimento do promotor para publicação da prova da justiça

Admoestação antes da publicação

fls. 50 img. 99 – Publicação da prova da justiça

No final o réu declarou ter contraditas com que vir e que queria estar com Procurador.

fls. 51 img. 101 – 10-9-1676 – Estância com Procurador

fls. 52 – img. 103 – Traslado da publicação da prova da justiça

fls 56 img. 107 – Contraditas redigidas pelo Procurador

1.O tempo declarado pela 1.ª testemunha cai em Maio de 1670, mais ou menos, altura em que o réu estava em casa de seus pais e o mesmo acontece com a 2.ª e 3.ª testemunha e nessas alturas, nunca teve comunicação com pessoa de nação, sobre judaísmo, coisa que nunca lhe interessou.

2.Quem lhe pode ter ódio é a família dos Pestanas, seja pela parte de João da Costa Cárceres, seja pela parte de seus cunhados Pestanas, pela inimizade que se originou entre seu primo Pedro Duarte Ferrão com Francisco Manuel Delgado e sua mulher Antónia Pestana com os quais sempre se renhiram; e depois das inimizades nunca mais se falaram.

fls. 55 img. 109 – 12-2-1677 - Nomeação de testemunhas às contraditas.

fls 56 img. 111 – 13-2-1677

Despacho recebendo apenas as contraditas ao segundo ponto, por o primeiro conter matéria já articulada.

fls. 57 img. 113 – 26-3-1677 – Depoimentos sobre as contraditas

- P.e Domingos Martins Viana, Capelão de S. Bartolomeu na Igreja de São Julião, natural e morador na cidade de Lisboa,  na entrada da Caldeiraria, de 35 anos de idade – Conhece Pedro Serrão desde criança. Disse que não sabe que entre ele e outros da nação dos cristãos novos houvesse quaisquer dúvidas ou diferenças. Que sempre viu muita familiaridade entre a família de António Serrão e os Pestanas e que se dizia até que Manuel da Costa Martins (1672 – Pr. n.º 81), reconciliado pela Inquisição ajudava materialmente a família de António Ferrão.  Sobre o segundo ponto, nada sabe.

- António Botelho, ourives, natural e morador em Lisboa, na Rua dos Ourives do ouro, cristão velho, de 42 anos de idade – Disse não conhecer o réu, mas apenas dois mancebos conhecidos como os “Bulhões”, que iam à Congregação do Oratório do P.e Quental, ambos sobrinhos do boticário António Serrão e ambos casados.

fls. 58 v img. 116 – 27-3-1677

- Francisco de Coimbra, imaginário, familiar do Santo Ofício, morador na cidade de Lisboa e natural dos Galegos, de 45 anos de idade – Conhece o réu há 8 ou 10 anos. Disse que não sabe que entre o réu e pessoas dos cristãos novos houvesse dúvidas ou diferenças algumas. Sobre o ponto segundo, disse também não saber coisa alguma, antes Brás de Almeida lhe dissera que a família dos Serrões com os Pestanas tinha grande amizade e porta aberta por dentro por onde se comunicavam.

fls. 59 v img. 118 – 29-3-1677

- Francisco Nunes, latoeiro, natural e morador em Lisboa, à Caldeiraria, cristão velho, de 30 anos – Conhece Pedro Serrão desde menino. Disse que não sabe que entre o réu e pessoas dos cristãos novos houvesse dúvidas ou diferenças algumas e que havia grande familiaridade entre os Serrões e os Pestanas. Sobre o ponto segundo, disse que não sabe coisa alguma, antes pelo contrário.

Note-se o enorme intervalo sem actividade no processo.

fls. 61 img. 121 – 10-10-1681 – Requerimento do Promotor para mais publicação – Admoestação antes da publicação

fls. 62 img. 123 – Publicação de mais prova da justiça – é o depoimento de Catarina de Crasto em 16 de Setembro de 1676. Interrogado, o réu disse que tudo era falso, que queria estar com o Procurador e tinha contraditas com que vir.

fls. 63 img. 125 – 13-10-1681 - Termo de novo Procurador – Nomeado Procurador do réu Francisco Soares Nogueira, por impedimento do anterior.

fls. 63 v img. 126 – 13-10-1681 -  Juramento do Procurador

fls. 64 img. 127 – 13-10-1681 - Estância com o Procurador

fls. 65 img. 129 – Traslado da prova da justiça – 4.ª testemunha

O Procurador requer que lhe seja indicado o lugar onde lhe é dada a culpa pela testemunha. A sumária resposta do Promotor diz que a culpa lhe é dada na cidade de Lisboa.

O Procurador alegou dois pontos de contraditas:

1.Antónia Pestana é inimiga capital do réu, porque queria casar com ele, mas ele não concordava, porque queria seguir a vida religiosa. Por isso ela perguntou-lhe às claras se cria na Lei de Moisés, e vendo que o réu não lhe respondia, mudou da afeição para ódio.

2.Noutra ocasião, estava Antónia Pestana acompanhada por sua tia Leonor da Costa (1656 – Pr. n.º 10726), fez de novo apertadas instâncias com o réu seguindo o mesmo intento e o réu respondeu-lhes com o mesmo desapego, pelo que nenhuma delas merece crédito.

fls. 66 img. 131 – 14-10-1681 – Nomeação das testemunhas às contraditas

fls. 67 img. 133 – 22-10-1681 – Despacho dos Inquisidores aceitando as contraditas, embora não respeitem à última testemunha.

fls. 68 img 135 – 23-10-1681 – Depoimentos sobre as contraditas

- José Leitão, volanteiro, natural e residente em Lisboa, cristão velho, de 51 anos – Disse que conhece o réu desde menino.  Disse que não sabe que entre o réu e pessoas dos cristãos novos houvesse dúvidas ou diferenças algumas. Disse que a matéria contida nos pontos das contraditas é muito falsa, por haver amizade entre os Pestanas e os Serrões e também por não ser possível um casamento entre as duas famílias, por os Pestanas estarem em mui diferente predicamento e qualquer proposta que lhes fizessem nesse sentido seria recusada,

- José Rodrigues, o Barata, sapateiro, natural de Oleiros e morador em Lisboa na Rua dos Escudeiros, cristão velho, de 44 anos. – Disse que conhece o réu há 20 anos. Disse que não sabe que entre o réu e pessoas dos cristãos novos houvesse dúvidas ou diferenças algumas. Disse nada saber sobre a matéria dos artigos das contraditas.

- Vicente Luis, sapateiro, familiar do Santo Ofício, natural e morador em Lisboa, no Largo da Rua dos Escudeiros. Conhece o réu desde a meninice. Disse que não sabe que entre o réu e pessoas dos cristãos novos houvesse dúvidas ou diferenças algumas. Disse que da matéria dos artigos das contraditas não sabia coisa alguma nem em tal casamento ouviu falar nunca.

fls. 72 img. 143 – 16-1-1682

Notificado o réu para formar interrogatórios, isto é, indicar as perguntas a fazer de novo às testemunhas da justiça, o que fará junto com seu Procurador.

fls. 72 v img. 144 – 16-1-1682 – Estância com o Procurador

fls. 73 img. 145 – Traslado da prova da justiça restituído pelo Procurador do réu (à margem: Deu-se esta publicação ao réu. 23 de Junho de 1676)

fls. 74 img. 147 – O Procurador indica as perguntas para as testemunhas serem reperguntadas.

fls. 75 img. 149 – 29-2-1682 – certidão de ser reperguntada a 1.ª testemunha contra este réu.

O Notário João Cardoso certifica que, tendo examinado o processo de Lourenço da Costa, filho natural de Martim Afonso da Costa, (1673 – Pr. n.º 7395), verificou que ali Antónia Pestana foi reperguntada em 31-1-1682 em relação ao seu depoimento contra Pedro Serrão, que confirmou e ratificou totalmente (Pr. n.º 7395, fls. 93 img. 195 e ss.).

fls. 76 img. 151 – 29-2-1682  - certidão de ser reperguntada a 2.ª testemunha contra este réu.

O Notário João Cardoso certifica que, tendo examinado o processo de Lourenço da Costa, filho natural de Martim Afonso da Costa, (1673 – Pr. n.º 7395), verificou que ali Filipa Pestana foi reperguntada em 5-2-1682 em relação ao seu depoimento contra Pedro Serrão, que confirmou e ratificou totalmente (Pr. n.º 7395, fls. 102 img. 213 e ss.).

fls. 77 img. 153 – 6-2-1682 - certidão de ser reperguntada a 3.ª testemunha contra este réu.

O Notário João Cardoso certifica que, tendo examinado o processo de António Serrão de Crasto, pai do réu, (1672 – Pr. n.º 4910), verificou que ali Pedro Ribeiro foi reperguntado em 28-1-1682 em relação ao seu depoimento contra Pedro Serrão, que confirmou e ratificou totalmente (Pr. n.º 4910, fls. 131 img. 263 e ss.).

fls. 78 img 155 – 29-2-1682 - certidão de ser reperguntada a 4.ª testemunha contra este réu.

O Notário João Cardoso certifica que, tendo examinado o processo de António Serrão de Crasto, pai do réu, (1672 – Pr. n.º 4910), verificou que ali Catarina de Crasto foi reperguntada em 29-1-1682 em relação ao seu depoimento contra Pedro Serrão, que confirmou e ratificou totalmente (Pr. n.º 4910, fls. 139 img. 279 e ss.)

fls. 78 v img. 156 – 17-3-1682 – O processo é feito concluso para a Mesa

fls. 79 img. 157 – 17-3-1682 – Assento da Mesa

Por unanimidade, decidem que o réu vá ao tormento. pela 1.ªvez se fala da diminuição do crédito do testemunhas das duas Pestanas, pelo que o primo Pedro Duarte Ferrão provou nas suas contraditas “as quais lhe devem valer pelo chegado parentesco que entre si têm”.

fls. 81 img. 161 – 1-4-1682 – Admoestação antes da sentença do tormento

fls. 82 img. 163 – Sentença do tormento

fls. 82 v img. 164 – 1-4-1682 - Na casa do tormento

O réu disse que não tinha culpas que confessar. No tormento chamava pelo nome de Jesus, e repetia que não tinha culpas que confessar. Foi atado perfeitamente e depois desatado. Durou o tormento o espaço de quatro ou cinco Credos.

fls. 84 img. 167 – 7-4-1682 – Estância com Procurador

fls. 85 img. 169 –Publicação de mais prova da justiça – 5.ª testemunha – sua tia Francisca Serrã

O Procurador junta as questões para reperguntar a testemunha.

fls. 86 img. 171 – 10-4-1682 - certidão de ser reperguntada a 5.ª testemunha contra este réu.

O Notário João Cardoso certifica que, tendo examinado o processo de Luis de Bulhão, primo do réu, (1673 – Pr. n.º 7688), verificou que ali Francisca Serrã foi reperguntada em 8-4-1682 em relação ao seu depoimento contra Pedro Serrão, que confirmou e ratificou totalmente (Pr. n.º 7688, fls. 76 img. 151 e ss.).

fls. 87 img. 173 – 10-4-1682 - – Requerimento do promotor

Admoestação antes da publicação da prova da justiça

fls. 88 img. 175 – Publicação de mais prova da justiça – 5.ª testemunha – Francisca Serrã – tia

Acabada a leitura da culpa, interrogado o réu, disse que era tudo falso, mas que não tinha contraditas com que vir, nem queria estar com o Procurador. O Inquisidor então o “lançou  e houve por lançado das com que pudera vir”, fórmula habitual.

fls. 89 img. 177 – 15-4-1682 – Estância com o procurador por determinação dos Inquisidores que transmitiram àquele Licenciado o 5.º testemunho.

fls. 90 img. 179 – Cópia do testemunho da 6.ª testemunha que é sua tia Paula de Crasto. O Procurador requer que seja reperguntada com os mesmos “interrogatórios” das outras testemunhas.

fls. 91 img. 181 – 26-4-1682 - certidão de ser reperguntada a 5.ª testemunha contra este réu.

O Notário João Cardoso certifica que, tendo examinado o processo de Pedro Duarte Ferrão,  primo do réu, (1673 – Pr. n.º 8096), verificou que ali a tia dele Paula de Crasto foi reperguntada em 18-4-1682 em relação ao seu depoimento contra Pedro Serrão, que confirmou e ratificou totalmente (Pr. n.º 8096, fls. 120 img. 239 e ss.).

fls. 92 img 183 – 16-4-1682 - – Requerimento do promotor

Admoestação antes da publicação de mais prova da justiça

fls. 93 img. 185 - Publicação de mais prova da justiça – 6.ª testemunha – Paula de Crasto  – tia

Acabada a leitura da culpa, interrogado o réu, disse que era tudo falso. “Disse que era verdade o que se continha no princípio da dita publicação, porquanto haverá quinze anos pouco mais ou menos que ele Réu se achou em casa de Lourenço Pestana, cristão novo, contratador, casado com Brites da Costa (1672 - Pr. n.º 126), cristã nova, com Antónia Pestana e Inês Pestana, filhas dos mesmos, solteiras, e seria então mais moça de 16 anos de idade, naturais e moradoras desta dita cidade; e estando todos três entre práticas, disseram as ditas Antónia Pestana e Inês Pestana a ele Réu que cresse e vivesse na Lei de Moisés, porque andava errado, em crer e viver na Lei de Cristo Senhor Nosso e que por observância da dita Lei de Moisés fizesse o jejum do Dia Grande, e que o dia em que caía lhe ensinaria Filipa da Costa Cáceres (1672 - Pr. n.º 2598), solteira, porquanto elas não sabiam, e ele Réu lhe respondeu que não queria crer na tal Lei, senão na de Cristo Senhor Nosso, em que sempre creu e viveu e de presente, cré e vive. E que isto é o que tem que declarar sobre a primeira parte da dita publicação, com o que também declara, ser a segunda parte dela falsa. E mais não disse.

Perguntado se quer estar com o Procurador e formar contraditas, disse que sim. Por isso, foi-lhe dado o traslado da publicação.

fls. 95 v img. 190 – 18-4-1682 – Estância com Procurador

fls. 95-A img. 191 – Cópia do testemunho que há contra Pedro Serrão – A cópia parece ser da 7.ª testemunha, seu primo Luis de Bulhão.

O Procurador requer no final do traslado que seja reperguntada a testemunha com os mesmos interrogatórios.

Fls. 96 img. 193 – 18-4-1682 - - certidão de ser reperguntada a 7.ª testemunha contra este réu.

O Notário João Cardoso certifica que, tendo examinado o processo de Pedro Duarte Ferrão,  primo do réu, (1673 – Pr. n.º 8096), verificou que ali o primo dele Luis de Bulhão foi reperguntado em 17-4-1682 em relação ao seu depoimento contra Pedro Serrão, que confirmou e ratificou totalmente (Pr. n.º 8096, fls. 127 img. 253 e ss.).

fls. 97 img. 195 – 18-4-1682 - Requerimento do promotor

Admoestação antes da publicação de mais prova da justiça

fls. 98 img. 197 - Publicação de mais prova da justiça – 7.ª testemunha – Luis de Bulhão - primo

Lido o testemunho, o réu disse que era tudo falso. Disse que não tinha contraditas nem queria estar com o seu Procurador. O Inquisidor então o “lançou  e houve por lançado das com que pudera vir”.

fls. 99 img. 199 – 24-4-1682 – Estância com o Procurador

fls. 100 img. 201 – Cópia do depoimento da 8.ª testemunha, seu irmão Luis Serrão

O Procurador requer que a testemunha seja reperguntada.

fls. 101 img. 203 – 24-4-1682 - certidão de ser reperguntada a 8.ª testemunha contra este réu.

O Notário João Cardoso certifica que, tendo examinado o processo de Teresa Maria de Jesus  irmã do réu, (1673 – Pr. n.º 4911), verificou que ali o irmão dele Luis Serrão foi reperguntado em 24-4-1682 em relação ao seu depoimento contra Pedro Serrão, que confirmou e ratificou totalmente (Pr. n.º 4911, fls. 91 img. 181 e ss.).

fls. 102 img. 205 – 15-4-1682 - Requerimento do promotor

Admoestação antes da publicação de mais prova da justiça

fls. 103 img. 207 - Publicação de mais prova da justiça – 8.ª testemunha – Luis Serrão – irmão

Lido o testemunho, o réu disse que era tudo falso e que não tinha contraditas com que vir, mas foi mandado estar com ele pelo Inquisidor.

fls.104 img. 209 – 25-4-1682 – Estância com o Procurador.

fls. 105 img. 211 – Traslado do depoimento da 8.ª testemunha, seu irmão Luis Serrão

O traslado está repetido, segundo parece. O Procurador faz notar a pouca idade que o réu teria na altura das culpas – 10 ou 11 anos -   e que seria difícil que o réu já discutisse assuntos tão sérios.

fls. 105 v img. 212 – 25-4-1682

Os Inquisidores mais um deputado despacham: “Visto como estando o réu Pedro Serrão com seu Procurador, para lhe formar contraditas, não veio com elas, o lançamos e havemos por lançado das com que pudera vir.” Quando à alegação da pouca idade ao tempo das culpas, “recebemos por informação somente, para se ler a final; corra este processo em seus termos”.

fls. 106 img. 213 – 27-4-1682 – Estância com o Procurador

fls. 107 img. 215 – Traslado do depoimento da 9.ª testemunha, o pai do réu

O Procurador requer que a testemunha seja reperguntada com os mesmos interrogatórios das antecedentes.

fls. 108 img. 217 – 27-4-1682 - certidão de ser reperguntada a 9.ª testemunha contra este réu.

O Notário João Cardoso certifica que, tendo examinado o processo de Teresa Maria de Jesus  irmã do réu, (1673 – Pr. n.º 4911), verificou que ali o pai de ambos, António Serrão de Crasto, foi reperguntado em 27-4-1682 em relação ao seu depoimento contra Pedro Serrão, que confirmou e ratificou totalmente (Pr. n.º 4911, fls. 107 img. 213 e ss.).

fls. 109 img. 219 – 27-4-1682 - Requerimento do promotor

Admoestação antes da publicação de mais prova da justiça

fls. 110 img. 221 –Publicação de mais prova da justiça – 9.ª testemunha – António Serrão de Crasto – pai

Interrogado após a leitura, disse que era tudo falso e que não queria estar com o seu Procurador, mas o Inquisidor mandou que estivesse.

fls. 111 img. 223 – 28-4-1682 – Estância com o procurador

fls. 112 img. 225 – Traslado da publicação de mais prova da justiça – 9.ª testemunha – António Serrão de Crasto – pai

O procurador pede a piedade do Tribunal  

Os Inquisidores despacham de novo Os Inquisidores mais um deputado despacham: “Visto como estando o réu Pedro Serrão com seu Procurador, para lhe formar contraditas, não veio com elas, o lançamos e havemos por lançado das com que pudera vir.” Mandam trasladar do processo da irmã do réu, Teresa Maria de Jesus, as diligências efectuadas para averiguar do crédito das mesmas testemunhas. “E se perguntem 6 testemunhas cristãs velhas, e sem suspeita, que bem conheçam o réu para que declarem se tem dúvidas e diferenças com algumas pessoas que fossem presas ou simplesmente negócio neste S.to Ofício, de que se originaram, quanto tempo há e a que chegaram, e se depois tornaram a correr em amizade. Lisboa em Mesa, 28 de Abril de 1682”.

fls. 116 img. 229 – 28-4-1682 – Diligências ex officio sobre o crédito das testemunhas

- Maria Antunes, solteira, natural e moradora em Lisboa na Rua dos Escudeiros, de 56 anos pouco mais ou menos – Interrogada, disse conhecer há cerca de 30 anos por ser vizinha a Antónia Pestana, Filipa Pestana, Catarina de Crasto, Filipa da Costa, viúva, Pedro Ribeiro, António Serrão, Francisca Serrã, Paula de Crasto, Luis de Bulhão e Luis Serrão. São pessoas de bom crédito, fama  e reputação,  e entende que aos seus ditos se pode dar inteira fé e crédito em juízo e fora dele, porque entende que não são mentirosas, nem sabe que levantassem falso testemunho de alguma pessoa.

- Filipa Barrosa, viúva de Julião Martins, que foi sapateiro, natural e moradora na Rua dos Escudeiros, de 50 anos. -  Testemunho totalmente idêntico ao anterior.

- Vicente Luis, familiar do Santo Ofício, residente na Rua dos Escudeiros, em Lisboa, de 72 anos. – Testemunho totalmente idêntico aos anteriores.

- Luis de Lemos, familiar do Santo Ofício, residente na Rua dos Escudeiros, em Lisboa, de 39 anos de idade.  Testemunho idêntico aos anteriores.

- Pedro da Silveira, volanteiro, natural e morador em Lisboa, na Rua dos Escudeiros, de 48 anos. Testemunho idêntico.

- José de Miranda, Solicitador do Santo Ofício, natural de Lisboa e morador a S. José, de 50 anos. Testemunho idêntico.

Estes depoimentos foram trasladados do proc. n.º 4911, de Teresa Maria de Jesus, irmã do Réu.

fls. 118 img.237 – 28-4-1682 – Testemunhos sobre ódios e inimizades.

- Luis de Lemos, familiar do Santo Ofício, residente na Rua dos Escudeiros, da cidade de Lisboa. – Disse conhecer Antónia Pestana, Filipa Pestana, Catarina de Crasto, Filipa da Costa, viúva, Pedro Ribeiro, António Serrão de Crasto,  Francisca Serrã, Paula de Crasto, Luis de Bulhão e Luis Serrão; e que também conhece ao réu Pedro Serrão, filho de António Serrão de Crasto, boticário. Interrogado, disse que não sabe que entre o réu e as pessoas sobreditas houvessem dúvidas, brigas e diferenças de que resultassem ódios nem inimizades e se os houvera saberia ele testemunha, por ser vizinho, como dito tem.

- Pedro da Silveira, volanteiro, natural e morador em Lisboa, na Rua dos Escudeiros, de 48 anos. Testemunho idêntico.

- Rafael de Pavia, volanteiro, natural e morador em Lisboa, na Rua dos Escudeiros, de 50 anos. Testemunho idêntico.

- José de Miranda, Solicitador do Santo Ofício, natural de Lisboa e morador a S. José, de 50 anos. Testemunho idêntico.

- Vicente Luis, familiar do Santo Ofício, residente na Rua dos Escudeiros, em Lisboa, de 72 anos. – Testemunho  idêntico.

- João Leitão, volanteiro, morador em Lisboa, na Rua dos Escudeiros, de 50 anos. – Testemunho idêntico.

fls. 126 img. 253 – 27-4-1682 – 1.ª sessão apertada

O réu repetiu mais uma vez que não tem culpas que confessar. Reconhece que foi admoestado muitas vezes para confessar as suas culpas. Tinham-lhe dado curador e Procurador. Mas não necessita de estar com o Procurador. Perguntado se sabe em que termos se encontra o seu processo, respondeu que gostaria que lho dissessem.  É-lhe feita uma exposição sobre o decurso do processo, e é convidado uma vez mais a declarar a verdade das suas culpas, pois está o despacho do seu processo o mais arriscado e ele réu em perigoso estado. 

fls. 129 img. 259 – 28-4-1682 – 2.ª sessão apertada

Repetiu que não tinha culpas que confessar. Disse que não tinha necessidade de mais tempo para examinar a sua consciência. Depois de tantos anos de prisão, já não tem mais nada a dizer. Foi-lhe dito: “porque nesta Mesa se deseja muito sua salvação e usar com ele de misericórdia, e está ainda em tempo de a poder merecer, melhorando sua causa com fazer inteira e verdadeira confissão de suas culpas, de novo o tornam a admoestar da parte de Cristo Senhor Nosso declare toda a verdade porque, como se lhe tem dito, sem embargo do que tem alegado em sua defesa e contraditas, está o despacho de seu processo muito arriscado e ele Réu em perigoso estado.”

fls. 131 img. 263 – 30-4-1682 – O processo é feito concluso.

fls. 132 img. 265 – 30-4-1682 – Assento da Mesa

Contra o réu existem 9 testemunhos de declaração de juízo em forma, todos de igual qualidade e crédito, que não foram diminuídos pela sua defesa e contraditas, nem pelas diligências que ex officio se fizeram.  “E, nestes termos, sendo a prova acrescida tão considerável, o parentesco tão chegado, e tais parentes que não disseram do réu senão no tormento, sua tia Paula de Crasto só depois de notificada; e seu Pai que o levou grave e nada disse, senão depois da publicação em que entendeu que pela dita prova tornava a ele, o réu como herege apóstata de nossa Santa Fé Católica, negativo convicto e pertinaz, devia ser entregue à justiça secular…”.

fls. 133 img. 267 – 1-5-1682 – O processo é feito concluso.

fls. 134 img. 269 – 1-5-1682 – Assento do Conselho Geral

convicto no crime de heresia, e apostasia e que, como herege apóstata da nossa Santa Fé Católica, negativo, convicto e pertinaz, seja relaxado à Justiça secular, servatis servandis, e que incorreu em sentença de excomunhão maior, e confiscação de todos seus bens para o Fisco e Câmara Real e nas mais penas de Direito, confirmam sua sentença por seus fundamentos e pelo mais dos autos. Mandam que assim se cumpra e dê a execução”.

fls. 136 img 273 – 1-5-1682 - Auto de notificação

lhe foi dito que este seu processo foi visto por pessoas doutas, tementes a Deus, e de sã consciência e se assentou que ele estava convencido no crime de heresia e apostasia e por herege apóstata (...) foi julgado e pronunciado; pelo que o admoestam de novo da parte de Cristo Senhor Nosso abra os olhos da alma, confessando suas culpas, e dizendo toda a verdade delas, porque isso é o que lhe convém, para merecer a misericórdia que a Santa Madre Igreja manda conceder aos bons e verdadeiros confitentes. E por dizer que não tinha culpas algumas que confessar, foi mandado para seu cárcere.”

fls. 137 img 275 – 8-5-1682 -  Auto de citação

O Notário e o Alcaide notificam-no de que domingo, dia 10 de Maio, irá ao auto público da fé, onde ouvirá sua sentença pela qual está relaxado à justiça secular. Um guarda atou-lhe as mãos, que assim ficariam até domingo. Ficou com ele o P.e Francisco Tavares, da Companhia de Jesus, “para com o mesmo tratar das coisas da sua alma”.

fls. 138 img. 277 – Cópia de um 10.º testemunho de Maio de 1682

Não há modo de poder identificar quem fez mais esta denúncia, no início de Maio. O Procurador ainda requereu em 6 de Maio que a testemunha fosse reperguntada.

fls. 140 img. 281 - Sentença

fls. 142 img 285 – Anotação de a sentença ter sido publicada no auto da fé de 10 de Maio de 1682

 

A sentença da Relação foi do seguinte teor:

“Vista a sentença junta dos Inquisidores, Ordinários e Deputados da Santa Inquisição, e como por ela se mostra o R. preso Pedro Serrão ser herege e apóstata da nossa Santa Fé Católica, convencido no crime de judaísmo, e por tal relaxado á justiça secular: Vista a disposição de direito e Ordenação em tal caso, o condenam a que com baraço e pregão pelas ruas públicas e costumadas desta cidade seja levado á Ribeira dela, aonde afogado (garrotado) morra morte natural, e ao depois de morto será queimado e feito por fogo em pó, de maneira que nunca do seu corpo e sepultura possa haver memoria, e o condenam outrossim em perdimento dos seus bens para o Fisco e Câmara real, posto que ascendentes ou descendentes tenha, os quais declaram por incapazes, inábeis e infames na forma de direito e Ordenação. E pague as custas destes autos.

Lisboa, 10 de Maio de 1682. Oliveira – Basto Pereira – Lacerda - Magalhães – Rego – Almeida "

 

fls. 143 img. 287 – Conta de custas: 7 393 réis.

 

TEXTOS CONSULTADOS

 

 

Academias dos Singulares de Lisboa, dedicadas a Apollo - Lisboa: na Officina de Henrique Valente de Oliveira, 1665-1668 – 2 tomos em 2 vols.

Online: http://purl.pt/21936 

 

Academias dos Singulares de Lisboa. Dedicadas a Apollo - Lisboa: na Officina de Manoel Lopes Ferreyra & à sua custa, 1692-1698. – 2 tomos em 2 vols.

Online: http://purl.pt/21937

 

António Baião, Episódios dramáticos da Inquisição Portuguesa, Porto, Renascença Portugueza, 1924, 2.º vol., pags. 9-35

Online: www.archive.org

 

António Serrão de Crasto, Os ratos da inquisição,  seguido de A Francisco Mezas, prefácio biográfico de Camilo Castelo Branco, Lisboa, Frenesi, 2004.

 

Benair Alcaraz Fernandes Ribeiro, António Serrão de Crasto: um poeta marrano e seu trágico destino, in Ensaios sobre a intolerância - Inquisição, Marranismo e Anti-semitismo (Homenagem a Anita Novinsky), organização de Lina Gorenstein e Maria Luiza Tucci Carneiro, 2.ª edição, Associação Editorial Humanitas, São Paulo, 2005,  ISBN 85-98292-79-6. pgs. 223-240

 

Benair Alcaraz Fernandes Ribeiro, Um Morgado de Misérias, o Auto de um Poeta Marrano, Associação Editorial Humanitas, São Paulo, 2007,  ISBN 978-85-7732-023-3

 

Sentença da Inquisição e da Relação contra Pedro Serrão de Crasto em 1682 (Pr. n.º 9797, da Inq. de Lisboa) in O INSTITUTO, Ano IX, 1860/61, pags. 298 a 300

Online: https://bdigital.sib.uc.pt/institutocoimbra/IndiceInstituto.htm

 

Michael Geddes, Miscellaneous Tracts, 1.st volume, London, MDCCXIV:

V. A View of the Inquisition of Portugal; with a List of the Prisoners which came out of the Inquisition of Lisbon, in an Act of the Faith, celebrated Anno 1682. And another in 1707.

VI. A Narrative of the Proceedings of the Inquisition in Lisbon, with a Person now living in London, during his Imprisonment there.

Online: http://books.google.com