18-6-2006

 

Aquiles Estaço

(1524-1581)

 

Aquiles Estaço nasceu a 12 de Junho de 1524 em Vidigueira, filho de Paulo Nunes Estaço, homem de armas, que acompanhou Vasco da Gama à Índia na sua segunda viagem em 1524. Chamou Aquiles ao filho porque desejava que seguisse a carreira das armas. Tanto assim que o levou com apenas 8 anos a África e ao Brasil. A facilidade com que o menino aprendeu a língua dos nativos convenceu Paulo Nunes a desistir da formação guerreira que queria dar a seu filho e a enviá-lo para a pátria para estudar latim e grego. Teve como professor João de Barros e, como companheiro de estudos, o filho deste, António.

De Évora, Aquiles seguiu para Coimbra onde conheceu Martim Azpilcueta (de Navarra) que ali foi professor de 1538 a 1555. A ele dedicará em 1575 a sua obra De retibus ecclesiasticis qui beneficiis et pensionibus continentur Commentarioli II, que foi a sua publicação que mais difusão teve. Parece que não se matriculou oficialmente na Universidade, mas não restam dúvidas que ali estudou. Possivelmente, foi também em Coimbra que conheceu Inácio de Morais, de quem ficou amigo.

Por volta de 1545 vai estudar para Lovaina. Também aqui se não matriculou oficialmente. Com apenas 23 anos, publica ali a sua primeira obra, Achillis Statii Lusitani Syluulae Duae. Quibus adiuncta sunt, Praefatio in Topica Ciceronis, et oratio quodlubetica eiusdem. Nunc primum in lucem aedita.

Em 1548 vai para Paris, onde prossegue os estudos de teologia, grego e hebraico. Não se sabe a certeza de quando é que partiu para Roma, mas supõe-se que terá sido em 1555, uma vez que em 1557 estava em Pádua.

Em Roma foi secretário e bibliotecário do Cardeal Sforza, a quem dedicou em 20 de Maio de 1561 o mapa de Portugal que encomendou a Fernando Álvares Seco e que depois (1575) foi copiado para o Theatrum Orbis Terrarum, de Abraão Ortélio:

 

 

Guidoni Ascanio Sfortiae S. R. E. Cardinali Camerario Aquilles Status Sal.

Lusitaniam Guido Sfortia Vernandi Alvari Secco industria descriptam tibi ob gentis nostrae patrocinium dicamus hinc homines incredibili virtute ac felicitate profeti omnis orbis terrarum partes obiuerant Africae magnam partem in prouinciam redegerunt innumerabiles insulsas quarum aut nomen tantum aut ne nomen quidam ullum exstabat primi patefecerunt, idemque occupauerunt Asiam terram beatissimam sibi stipendiariam fecerunt remotissimas nationes Jesu Christi cultum religionemque docuerunt. Vale. Romae XIII Kal. Iun. MDLXI.

 

 

A Guido Ascânio Sforza cardeal camareiro da Santa Igreja Romana, Aquiles Estaço saúda.

Guido Sforza: dedicamos-te, devida à protecção dispensada à nossa gente, a Lusitânia descrita pela arte de Fernando Álvares. Dela partindo, homens de incrível valor e felicidade atingiram todas as partes do orbe terráqueo, reduziram à condição de província grande parte da África, foram os primeiros a descobrir e ocupar ilhas inúmeras, das quais era conhecido, ou só o nome, ou nem o nome sequer. Obrigaram a Ásia, terra riquíssima, a pagar-lhes tributo, instruíram os mais remotos povos no culto e religião de Jesus Cristo. Adeus. Em Roma, 20 de Maio de 1561.

 

 

 

 

Aquiles Estaço esteve também ao serviço do Cardeal Santa Flor e conheceu e conviveu com muitos outros cardeais.

Foi protegido pelos Papas Pio IV, Pio V e Gregório XIII. Não obstante tal protecção, Aquiles Estaço pediu em 1560 um benefício em Óbidos, nisso se empenhando o Embaixador Lourenço Pires de Távora. Em Fevereiro de 1561, na Corte desejam que ele regresse a Portugal para escrever em latim a história de Portugal.  Pedem-lhe também para ler a oração de obediência que leva o Embaixador Fernão Martins Mascarenhas, junto do Concílio de Trento. Aquiles Estaço reage ofendido, dizendo que sabe muito bem escrever latim e não aceita que outros escrevam para ele ler. De facto a oração de obediência no Concílio foi pronunciada em 9 de Fevereiro de 1562, pelo professor de Coimbra, Belchior Cornejo (online, aqui).

Aquiles Estaço hesita em volta a Portugal. O seu amigo Inácio de Morais, em carta de 1 de Dezembro de 1573, recomenda-lhe vivamente que se deixe estar em Roma:

 

 

Quod se me faz est tibi homini prudentissimo consilium dare, in isto loco consiste procul a Lusitania esuritione. Nam huc si redeas, esuries etiam si intactam (ut ille ait) Paridi uendas Agauem.

 

 

E se me é permitido que eu dê a ti, homem prudentíssimo, um conselho, continua nesse lugar, longe da penúria lusitana. Com efeito, se aqui regressares, “passarás fome, mesmo que vendas a Paris” – como diz o famoso poeta – “Agave ainda virgem”.

 

Tradução do Prof. Américo da Costa Ramalho - 1994

 

 

Aquiles Estaço não regressou a Lisboa, possivelmente também por outras razões, como refere o seu parente Gaspar Estaço na pequena biografia que inseriu nas Várias antiguidades de Portugal (1625):  “El-Rei D. Sebastião lhe mandou oferecer honrosos partidos para que viesse para a Torre do Tombo e escrevesse os feitos dos Portugueses; mas porque um ministro que isto tratava, esse mesmo o estorvava, não veio. “

Em 17 de Fevereiro de 1575, D. Sebastião escreve-lhe agradecendo a oração de obediência por ele pronunciada em 1574 perante Gregório XIII, a última que fez (a primeira fora em 1560 perante o Papa Pio IV).

Faleceu em Roma em 17 de Setembro de 1581, deixando os seus bens aos Padres do Oratório (congregação fundada por S. Filipe de Néri). Importante o legado da sua biblioteca, constituída por cerca de 1700 obras impressas e pelo menos 270 códices manuscritos, e que veio a constituir o primeiro núcleo da Biblioteca Vallicelliana, fundada por S. Filipe de Néri junto à Chiesa Nuova. Nesta igreja foi sepultado Aquiles Estaço, vestido com o hábito de S. Domingos.

A obra de Aquiles Estaço é muito extensa e está longe de estar estudada. Transcreve-se aqui a lista fornecida por Barbosa Machado.

Para aferir da sua importância, note-se que o seu Comentário a Catulo (impresso em Veneza em 1566 por Paolo Manuzio) existe em 33 bibliotecas italianas, o que deve ser um recorde para uma obra do sec. XVI.

 

Ver  Insignia Regum Lusitaniae, aqui

 

 

LINKS:

 

Inlustrium virorum ut exstant in Urbe expressi vultus, Rome : A. Lafrerius, 1569.

http://www.ials.sas.ac.uk/warburg/ckn1010statw.pdf

 

C. Suetonii Tranquilli libri II. De inlustribus grammaticis et claris rhetoribus. Cum Achillis Statii Lusitani commentatione. Antverpiae, ex officina Christophori Plantini architypographi regii, M D LXXIIII. (excertos)

http://www.europahumanistica.org/article.php3?id_article=13

 

Mapa de Ortélio:

 

Mapa: http://www.orteliusmaps.com/book/ort26.html

Texto: http://www.orteliusmaps.com/book/ort_text26.html

Bibliografia: http://www.orteliusmaps.com/book/ort_bibl26.html

 

Andreas Schottus- Hispaniae Bibliotheca seu de Academiis ac Bibliothecis. Tomis III distincta. Francofurti: Apud C. Marnium & haeredes J. Aubrii, 1608.

http://books.google.com/books?id=aF0ysoxlH3sC&printsec=titlepage (Págs. 483 a 490)

 

Nicolau António, Bibliotheca Hispana Noua, apud Joachim de Ibarra Typographum Regium, 1783.

http://bibliotecaforal.bizkaia.net/search*spi/tbibliotheca+hispana+noua/tbibliotheca+hispana+noua/1,1,2,B/l962&FF=tbibliotheca+hispana+noua+sive+hispanorum+scriptorum+qui+ab+anno+md+ad+mdclxxxiv+floruere+notitia&1,,2,002813,-1 (Págs. 39 e 40 do software)

 

Rosa Almaida Martínez

Comentario de Achilles Statius a Tibulo (Libro I). Edición, traducción y estudio

Tese de doutoramento. Universidade de Múrcia. Abril de 2005.

http://www.tdr.cesca.es/TDR-1121105-121818/

 

 

 

TEXTOS CONSULTADOS

 

 

Belmiro Fernandes Pereira,  As Orações de Obediência de Aquiles Estaço. Coimbra, Instituto Nacional de Investigação Científica. Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos da Universidade de Coimbra, 1991. ISBN 972-667-088-8

 

Belmiro Fernandes Pereira, «A Livraria de Aquiles Estaço», Librorum Venator et Hellvo, sep. de Humanitas n.º 45, 1993, págs. 255-305.

Online: http://www1.ci.uc.pt/eclassicos/bd_pdfs_hum/26/art_14_a_livraria_de_aquiles_estaco.pdf

 

Augusto Ascenso Pascoal, Aquiles Estaço e humanista teólogo , Documento electrónico, Tese, Universidade de Coimbra, 2002

 

António Dias Miguel, Aquiles Estaço : algumas notas bio-bibliográficas - Lisboa : [s.n.], 1942. - 50 f. -  Tese de licenciatura em Filologia Clássica apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1942, Cota TL-LP 358

 

José Leite de Vasconcelos, «Papéis de Achilles Estaço»: Petrus Nonius 3 (1940), págs. 153-170.

 

José Gomes Branco, «Un umanista portoghese in Italia: Achilles Estaço»: Relazioni storiche fra l’Italia e il Portogallo. Memorie e documenti. Roma, Reale Accademia d’Italia, 1940, 135-148.

 

José Gomes Branco, «A propósito da primeira obra de Achilles  Statius Lusitanus»: Humanitas 2 (1948-49) 81-92.

 

José Gomes Branco, Uma comemoração de Achilles Statius Lusitanus, Humanitas 2 (1948-49) 403-412

 

José Gomes Branco, Os discursos em latim do humanista Aquiles Estaço, sep. de Euphrosyne, vol. 1, 1955

 

José Gomes Branco, A propósito do Tibullus cum Commentario Achillis Statii Lusitani, sep. de Euphrosyne, nova série n.º 9, 1979, págs. 87-117

 

Nicolau António, Biblioteca Hispana Nova, Matriti, apud Joachimum de Ibarra 1783.

 

Diogo Barbosa Machado, Biblioteca Lusitana, edição fac-similada, Coimbra : Atlântida, 1965-1967

 

Justino Mendes de Almeida, Uma carta de D. Sebastião ao umanista Aquiles Estaço, in Revista da Faculdade de Letras – Lisboa, n.º 22 (1956), págs. 319-320

 

Gaspar Estaço, Varias antiguidades de Portugal, Lisboa, Pedro Craesbeek, 1625.

 

Gaspar Estaço, Tratado da Linhagem dos Estaços, naturais da cidade de Évora. Lisboa, Pedro Craesbeek, 1625.

 

Alves Ferreira, Custódio de Morais, Joaquim da Silveira e Amorim Girão, O mais antigo mapa de Portugal (1561), Faculdade de Letras, Universidade de Coimbra, 1957.

 

António de Portugal e Faria, Portugal e Itália: ensaio de diccionario bibliographico, Leorne: Typographia de Raphael Giusti, 1898-1926

Transcreve o manuscrito:

Frei Fortunato de S. Boaventura (1778-1884), Literatos Portugueses na Itália ou Colecção de subsídios para se escrever a História Literária de Portugal, que dispunha e ordenava Frei Fortunato Monge Cisterciente

 

1977 - Américo da Costa Ramalho, Notas sobre a formação de Aquiles Estaço, sep. de Biblos n.º 54, 1977, págs. 237-252.

 

1994 - Américo da Costa Ramalho, Latim Renascentista em Portugal, Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian : JNICT, 1994, ISBN 972-31-0620-5

  

Artur Beleza Moreira de Sá, Manuscritos e obras impressas de Aquiles Estaço, Coimbra, 1958, sep. de Arq. Bibliografia Portuguesa

 

Visconde de Santarém, Luís A. Rebello da Silva, Corpo Diplomático Português contendo os actos e relações políticas e diplomáticas de Portugal com as diversas potências do mundo desde o século XVI até aos nossos dias, vols. VIII e IX., Lisboa, 1862-1891

 

Alejandra Guzmán Almagro, Consideraciones sobre un poema laudatorio de Aquiles Estaço a varios humanistas, in Humanitas, vol. 54, Coimbra, 2002, págs. 319-331

 

Josef Ijsewijn, Achilles Status, a portuguese latin poet in late 16th century Rome, in Congresso Internacional sobre Humanismo Português na Época dos Descobrimentos, Coimbra, 1991, Coimbra, Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos, págs. 109-123.