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Gregorio de Mattos e Guerra

(1636 - 1695)

 

 

SENTENÇAS

 

 

PEGAS, Manuel Álvares, 1635-1696

 

Emanuellis Alvarez Pegas (Manoel Alvarez Pegas),  J.C. Lusitani et in Regio Supplicationis Senatu causarum Patroni celeberrimi, Promotoris Bullae Cruciatae, nec non Sacelli Regis, et Ecclesiarum Patronatus Regis,  RESOLUTIONES FORENSES PRACTICABILES,   ib quibus multa quae in utroque foro controversa quotidie versantur,uberrima Legum, et D.D. allegatione resolvuntur. Haec secunda editione suis in locis, ac numeris in matéria insertis, ipsiusque Actoris locupletata, quae in notis inclusa reperiunter. In quibus nedum Quaestiones Forenses propositae, sed etiam alii, ac magis controversi juris articuli excitantur, brevique methodo in praxi discutiuntur, et accurate resolvuntur; atque ut plurimum authoritate rerum judicatarum in Supplicationis Senatu comprobantur, et ad unamquamque materiam adduntur, eo studio et stylo ut nihil addendum supersit, et nihil cogitandum relinquatur, sed potius tratctatum importare videantur.

OPUS NOVIS AUCTUM QUAESTIONIBUS CIRCA PRAXIM

In duabus partibus divisum.

MAGISTRATIBUS, ADVOCATIS, CAETERISQUE IN UTROQUE

foro versantibus, non solum utile, sed quotidie necessarium.

PARS PRIMA

 

ULYSSIPONE

EX TYPOGRAPHIA MICHAELIS DESLANDES

Sumptibus et expensis Antonii Leyte Pereyra

Cum facultate Superiorum Anno 1682.

 

Biblioteca Nacional SC 4571/72  A.

Pags. 463.

Online: http://books.google.com

 

Sentença de 24 de Junho de 1672

 

No feyto de Antonio Rodrigues d’Elvas, com Manoel Lopes da Lavra e Belchior de Meyrelles Freyre, Escrivão Manoel Pinheyro da Costa, se deu a sentença seguinte.

 

Vistos estes autos, et c. Mostrase por parte do A. dar libello fol. 52 contra os RR. pedindolhes as penas dos que fazem contratos simulados: Por quanto prova, que tendo os RR. huma nao por nome Nossa Senhora da Graça e Remédios, que o A. capitineava na carreira do Brasil, os RR. a venderão em Pernambuco a Henrique Henriques de Miranda simuladamente, por seus particulares interesses, sendo partes na dita venda o A. com procuraçam dos RR. e Manoel Rodrigues de Sá com procuração do dito comprador Henrique Henriques, e que sendo o dito contrato simullado, e nullo por esse defeyto, e por tal julgado, como parece da sentença de fol. 29, os RR. encorrerão nas penas da Ley pela dita simulação, e nellas devem ser condemnados para elle A. Defendemse os RR. com a matéria de sua contrariedade fol. 65 allegando, que supposto esteja o dito contrato julgado por simulado; elles RR. não forão ahi declarados por simulantes, nem condemnados em pena algũa pela dita simulação, que o A. fez com o dito Henrique Henriques, e seu procurador: Pelo que concluem, que o A. carece de aução, e elles RR. devem ser absolutos. O que tudo visto, com o mais largamente articulado, e provado neste autos, e disposição de Direyto, e como se mostra, que o A. foy verdadeiramente simulante no dito contrato, pois outrogando  a escritura de venda em os 26. de Junho de 1666, já em 23 de Abril do dito anno havia para esse effeyto recebido  o escrito de resalva fol. 185 do comprador Henrique Henriques em 16. do dito mez, e anno, e outro de seu procurador fol. 186 vers. E sendo A. como foy simulante na venda, a Ley lhe não aplica pena algũa de dinheyro , e somente o releva de incorrer nella pela propallação, e em virtude da que fez  o A. se livrou somente da condemnação, como outrosim se livrou o R. Manoel Lopes da Lavra, pela que fez a fol. 30 vers. que Belchior de Meyrelles, quando qualquer delles, assim A. como RR. sejão pela sua simulação acusados. E visto outrosim como o A. não foy pessoa prejudicada no dito contrato, a favor do que a Ley aplica a tal pena, antes prejudicante; pois os direytos Reaes ficavão somente recebendo o prejuízo, como se refere no escrito do Procurador do comprador à fol. 187. E o A. como parte simulante lhe ficava fazendo prejuízo, e sem receber algum pois na parte em que o pudera receber, se resalvou pelos ditos escritos, sendo que ainda, sem a dita resalva, não é pessoa, a quem o Direyto tem por prejudicada em semelhantes simulaçoens, pois sam acredores, herdeyros e sucessores, em odio dos que se fazem, o que nam concorre no A. que foy parte simulante, e contrahente. Por tanto absolvo os RR. do pedido no libello do A. Ao qual condeno nas custas dos autos. Lisboa 24. de Junho de 1672. Gregorio de Mattos, e Guerra.

 

A qua sententia fuit appellatum ad Supplicationis Senatum. Ubi fuit confirmata. Judices Ribeyro D. Cerveyra, Cardoso.

Haec sententia fuit fundata in deliberationibus sequentibus.

 

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Emmanuelis Alvares Pegas, I. C. Lusitani, et in Régio Supplicationis Senatu Causarum Patroni,

Bullae Sanctae Cruciatae Promotoris, Mitrae Archiepiscopalis, Tam Bracharensis, quan Ulyssiponensis, ac Eborensis Procuratoris, et Lamecensis Advocati; nec non Ecclesiarum Capellae Regiae, et Patronatus Regii Fiscalis

 

TRACTATUS DE OBLIGATIONIBUS, ET ACTIONIBUS, ET DEFENSIONIBUS CIVILIBUS, ET CRIMINALIBUS, SAECULARIBUS, ET ECCLESIASTICIS, AD UTRIUSQUE FORI JUDICIA SPECTANTIBUS.

  

TOMUS SECUNDUS

 

seu

 

RESOLUTIONES FORENSES PRACTICABILES, circa actiones competentes Actoribus, et defensiones Reorum, pertinentes Magistratibus, Advocatis, caeterisque in utroque foro versantibus, non solum utiles, sed etiam quotidie necessaruae.

 

TOMUS QUARTUS

 

dicatus ac consecratus

BEATISSIMAE DEIPARAE

Subtitulo do

CASTELO

Singularissimae Patronae Eremitarum a Speluncis vulgo de Mont-furado

 

NUNC PRIMUM IN LUCEM PRODIT

 

 

ULYSSIPONE OCCIDENTALI

Ex Typographia. Dominici Gonçalves

Eorundum Eremitarum Typographi.

M.DCC.XXXIV,

Cum facultate Superiorum, et Regali Privilegio.

 

 

B.N. S.C. 55092 V.

 

Págs. 364

 

 

No Feito de appellação de Domingos Gonçalves Santiago contra Antónia da Sylva, Escrivão Manoel Pinheiro da Costa, se deu a Sentença seguinte.

 

Vistos estes autos, et c. Mostra-se por parte do A. que he mercador de manteigas, e outros géneros, e deu fiado a Maria Nunes manteigueira huma grande partida de barris de manteiga, que importou 102 U. que lhe começou a pagar, e de resto lhe ficou devendo 42U624. reis que a R. Antonia da Sylva deve pagar-lhe, porquando a dita Maria Nunes he falecida, e a R. sua irmãa se empossou de seus bens, e os sonegou em prejuizo dos credores, recolhendo-os escondidamente em varias partes, sem embargo do termo de abstenção, que fez a fol. 7.  Defende-se a R. e mostra, que estando sua irmã doente pelo desamparo, e pobreza, em que havia caído, pedio a Maria de Gouvea lhe largasse hum sobrado, onde a recolheo, para mais commodamente curar della, e para o dito sobrado não trouxera a mais  e dahi se tornara a recolher para sua própria casa, aonde logo faleceu, sem deixar mais bens, que os conteudos no rol, fol. 6 que mandou fazer ao tempo da morte, os quaes estão embargadosa requerimento do mesmo A. e assim não estando ella R. de posse dos bens da dita defunta, nem sendo sua herdeira, pois desistio, e havendo mais outra irmãa legitima herdeira da defunta, conclue, que não tem o A. acção, porquanto os bens, que a R. tem da dita defunta, são penhores de dinheiro, que lhe emprestou, que são hum relicário de ouro, e duas colheres de prata, e huma saia de estamenha em 7U reis, e um cobertor de pano em 2U reis. O que tudo visto, e o mais dos autos, e disposição de direito, e como se mostra, que a devedora originaria morreo sem testamento, e lhe ficarão por legitimas successoras a R. e outra irmãa de todos seus bens, e consta, que a R. desistio da herança a fol. 7 a qual prova, que não possue os bens da defunta, antes todos estão embargados à instancia do A. e que se não podem presumir sonegados, nem escondidos, visto o rol de fol. 6 que a defunta mandou fazer, como diz a testemunha a fol. 34 que foy o mesmo, que o escreveo, de que se prova o que a devedora possuía, e como estava tão pobre, que a R. lhe deu a roupa necessária para o seu enterro, e que as peças, que tem, estão em penhor de dinheiro, que a mesma sua irmã lhe devia, e não mostra o A. que das peças conteudas no dito rol lhe falte alguma, que he só o que podia intentar; por tanto absolvo a R. do pedido pelo A. ao qual condemno nas custas dos autos.

Lisboa, 12. de Abril de 673.

Gregório de Mattos

 

Haec sententia confirmata fuit in Supplicationis Senatu die 26 Junii anno 674 à Judicibus Doctore Tavares. Doctore Gouvea et Cardoso.

 

 

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Emmanuelis Alvares Pegas, I. C. Lusitani, et in Régio Supplicationis Senatu Causarum Patroni,

Bullae Sanctae Cruciatae Promotoris, Mitrae Archiepiscopalis, Tam Bracharensis, quan Ulyssiponensis, ac Eborensis Procuratoris, et Lamecensis Advocati; nec non Ecclesiarum Capellae Regiae, et Patronatus Regii Fiscalis

 

TRACTATUS DE OBLIGATIONIBUS, ET ACTIONIBUS, ET DEFENSIONIBUS CIVILIBUS, ET CRIMINALIBUS, SAECULARIBUS, ET ECCLESIASTICIS, AD UTRIUSQUE FORI JUDICIA SPECTANTIBUS.

  

TOMUS TERTIUS

 

seu

 

RESOLUTIONES FORENSES PRACTICABILES, circa actiones competentes Actoribus, et defensiones Reorum, pertinentes Magistratibus, Advocatis, caeterisque in utroque foro versantibus, non solum utiles, sed etiam quotidie necessaruae.

 

TOMUS QUINTUS

 

dicatus ac consecratus

BEATISSIMAE DEIPARAE

Subtitulo do

CASTELO

Singularissimae Patronae Eremitarum a Speluncis vulgo de Mont-furado

 

NUNC PRIMUM IN LUCEM PRODIT

 

 

ULYSSIPONE OCCIDENTALI

Ex Typographia. Dominici Gonçalves

Eorundum Eremitarum Typographi.

 

M. DCC.XXXV,

Cum facultate Superiorum, et Regali Privilegio.

 

 

B.N. S.C. 55093 V

 

Págs. 300-301

 

  

CAP  CII

 

Utrum actio emptionis, et venditionis ad consequendum pretium rei venditae, competat contra mediatorem et proxonetam, cui datae fuerunt margaritae, et mercês, ad hoc ut eas venderet certo pretio, et ille eas vendidit habita fide de pretio, vel competat contra emptorem haec actio?

 

 

Haec questio proponitur, et resolvitur in sententia, et deliberationibus sequentibus.

No Feito de António Roxo com António Carvalho, Escrivão Lourenço Correia de Torres, se deu a sentença seguinte.

 

Vistos estes autos, et c. Mostra-se dar a A. libello contra o R. em que lhe pede restituição das mayorias, que lhe pagou dos vinhos, que lhe vendeo, porque devendo as pipas do R. ter vinte e seis almudes, erão diminutas, e lhes faltavão em cada huma quatro canadas, três e meya, e mais, que em cento vinte e quatro pipas, que o A. lhe vendeo no discurso de cinco annos, lhe vem a dever todas essas mayorias; por quanto o A. lhe pagava as pipas por inteiro, e assim pede que o R. seja condemnado liquidando-se os ditos almudes. O R. se defende com a contrariedade, e prova, que as suas pipas erão todas marcadas, e asiladas, e nunca tiverão falta, nem deminuição, e que he homem de verdade, e bom procedimento; e finalmente pede ao A. por reconvença o preço de huma pipa de vinho, que lhe resta a dever, por quanto supporso lhe deu quitação geral, foy com o pretexto de o A. lhe continuar na venda dos seus vinhos, o que não fez, e por tanto deve ser condemnado. O que tudo visto, e o mais dos autos, e disposição de direito, e como se mostra que o A. não prova, que as pipas, que o R. lhe dava a vender fossem edenticamente deminutas, porque supposto, mostre que João Carvalho taverneiro testemunha a flo. 25 achasse diminuta huma pipa do R. dahi se não segue, que o fossem tambem as que deu ao A. alèm do que he dito único na dita falta, que de direito não faz prova. E do mesmo modo se não segue que as pipas, que o A. vendeo tivessem falta, de a ter as que vendeo Pedro Dias testemunha, sendo que mostra jurar animosamente em quanto depõem,  que o R. lhje deu oito mil reis pelas ditas faltas, visto o testemunho de sua mulher, de maneira, que tendo o A. obrigação de provar a identidade  das pipas, o não faz, sem embargo do juramento do medidot; porque ainda que affirma medir a pipa, não affirma ser do R. e se refere ao dito, e informação do A. como tambem o faz a testemunha fol. 33 e não basta para a condemnação cível, que o R. se presuma mão neste género, porque especificamente devia o A. provar, que as pipas do R. que elle lhe vendeo erão deminutas e faltas o que não prova, e por parte do R. se mostra em sua inquirição, e por testemunhas, que lhe consertavão as suas pipas, que erão todas da marca, e medida, que se requere segundo as posturas da Cidade; por tanto absolvo ao R. do pedidono libello do A. e deferindo à convenção do R. vistos os autos, e como por elles se mostra haver dado quitação  geral ao A. que he a que vem a fol. 56 e não provar haver remetido a pipa pedida pelo concerto, de que o A. continuasse na mesma vendagem, porque sendo contrato devia ser por ambos estipulado, o que se não fez; absolvo ao A. do pedido na reconvenção do R. e paguem as custas dos autos de permeyo. Lisboa 30. de Mayo de 673. Gregorio de Mattos Guerra.

 

A qua sententia fuit appellatum, ad Supplicationis Senatum, ubi fuit confirmata Judicibus Doctore Freire, Oliveira. Doctore Carvalho.

 

  

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Emmanuelis Alvares Pegas, I. C. Lusitani, et in Régio Supplicationis Senatu Causarum Patroni,

Bullae Sanctae Cruciatae Promotoris, Mitrae Archiepiscopalis, Tam Bracharensis, quan Ulyssiponensis, ac Eborensis Procuratoris, et Lamecensis Advocati; nec non Ecclesiarum Capellae Regiae, et Patronatus Regii Fiscalis

 

TRACTATUS DE OBLIGATIONIBUS, ET ACTIONIBUS, ET DEFENSIONIBUS CIVILIBUS, ET CRIMINALIBUS, SAECULARIBUS, ET ECCLESIASTICIS, AD UTRIUSQUE FORI JUDICIA SPECTANTIBUS.

 

TOMUS QUARTUS

 

seu

 

RESOLUTIONES FORENSES PRACTICABILES, circa actiones competentes Actoribus, et defensiones Reorum, pertinentes Magistratibus, Advocatis, caeterisque in utroque foro versantibus, non solum utiles, sed etiam quotidie necessaruae.

 

TOMUS  SEXTUS

 

dicatus ac consecratus

BEATISSIMAE DEIPARAE

Subtitulo do

LORETO

 

Singularissimae Patronae Monachorum Excalceatorum Divi Pauli, primi Eremitae hujus Civitatis Ulyssiponensis.

 

ULYSSIPONE OCCIDENTALI

Ex Typographia Dominici Gonçalves

Eorundum Eremitarum Typographi.

M.DCC.XXXVI,

Cum facultate Superiorum, et Regali Privilegio.

 

 

B.N. S.C. 55094 V

 

Pags. 323-324

 

 

No Feito de Manoel Pereira com os Irmãos de Nossa Senhora de Guadalupe, Escrivão Lourenço Correa de Torres, se deu a sentença seguinte.

 

Vistos estes autos, et c. Mostra-se por parte do A. que para effeito de resgatar huma escrava negra por nome Margarida, pela Irmandade de Nossa Senhora de Guadalupe, foy o Author com a dita escrava à mesa da dita Irmandade, e entregara para o dito resgate, desazzeis mil reis, o qual não tivera effeito, por quanto o senhor da dita escrava a vendera para Castella; e assim lhe devia a dita Irmandade tornar a restituir os dezasseis mil reis, por serem seus e os haver depositado para o dito resgate a favor da dita escrava, havendo pedido emprestados 9U500. reis a hum negro forro chamdo Francisco de Faria. Porém defende-se a Irmandade de Nossa Senhora de Guadalupe Re nestes autos, allegando, e mostrando, que os 16000. não são do Author, antes da mesma escrava, pelo haver ganhado, e assim o declarar na dita Mesa, quando se fez o dito deposito, e outrosim na Villa de Aldeã Gallega, quando por alli passou, e já vendida para Castella, com que não devião ser restituídos ao Author, por lhe não pertencerem, e não estar pela dita Irmandade o doto resgate, por haver feyto diligencia, e não querer vir nisso o senhor da dita escrava, antes a vender para Castella. O que tudo visto, e o mais dos autos, disposição de Direyto, e como prova o A. legitimamente haver pedido 9U500. reis emprestados para o dito resgate a favor da dita escrava, e não he bastante a prova que deo a Irmandade sobre ser o dinheyro da dita escrava, por quanto o jurão os mesmos Irmãos que assistiram ao recebimento do dinheiro, que vem a ser partes nestes autos, e o jurão de ouvida a mesma escrava, que não he legitima prova, por ser parte interessada, e não se lhe deve dar crédito em quanto affirma, que he seu o dito dinheiro, que se prova ser do Author, o que he a quantia de 9U500. reis, que consta pedira emprestados, e está obrigado por elles: Condemno a dita Irmandade, a que restitua, e pague ao Author os ditos 9U500. reis, e nas custas destes autos. Lisboa 14. de Junho de 1671. Gregório de Mattos, e Guerra.

 

Ab hac sententia fuit appellatum ad Supplicationis Senatum, ubi fuit confirmata et fundata in deliberationibus sequentibus.

Devotam Sodalitatem servorum Santissimae Virginis Deiparae nullum jus habere in pecunia in libello petita satis et actis apparere dubium non est: tradita ei fuit ad redimendam ancillam Margaritam, quae redemptio non fortita fuit effectum; quia vero A. solum probavit dedisse ad praedictam redemptionem 9U500 teruntios, quos ad illam mutavit, mérito in illis Sancta Sodalitas condemnata fuit per meritissimum Judicem; super expensis conferam. Ulyssipone 11. Augusti 1671.

Doutor Gouvea.

Convenit Judex et Senator Doctor Coutinho.

  

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PEGAS, Manuel Álvares, 1635-1696

 

Emanuellis Alvarez Pegas (Manoel Alvarez Pegas),  J.C. Lusitani, in Supplicationis Senatu causarum Patroni, et Mitrae Archiepiscopalis, tam Bracharensis, quam Ulyssiponensis, Portuensis, Lamecensis, Algarbiensisque Procuratori, ac etiam Sanctae Bullae Cruciatae Promotoris, necnon Capellae Regiae. Ecclesiarumque Patronatus Regii Fiscalis, Tractatus de Exclusione, Inclusione, Successione, et Eredictione Maioratus, In tres partes divisus, PARS PRIMA, nunc primum in lucem prodit Ulyssipone,  Ex Tipographia MICHAELIS DESLANDES, Sumptibus ANTONII LEITE PEREIRA, M. DC. LXXXV.1685,  Cum facultate Superiorum et Privilegio Regio,

 

págs 569 e 570 .

 

B.N. SC 782 V.

Online: http://bdigital.sib.uc.pt/bduc/Biblioteca_Digital_UCFD/digicult/UCFD-H-D-19-3_5/globalItems.html

 

Sentença de 10 de Junho de 1634 *

 

* A data está evidentemente errada. É 1674.

 

 

      No feito de João Freire de Mello contra Dona Joanna Botelho, Escrivão Manoel Pinheiro da Costa, se deo a sentença seguinte:

 

Vistos estes autos et c. Mostrase por parte de A. que é herdeiro de sua irmã Dona Maria da Sylva e Mello a qual herdou os bens livres de seu marido Lopo Botelho de Mello, entre os quais são dezassete oliveiras, que estão místicas com olivaes do morgado que a Ré possue, por succeder a sua irmã Dona Isabel Botelho, a qual succedera ao dito Lopo Botelho de Mello, porque falecendo este e separandose os bens livres, e de morgado, entre a dita Dona Maria, irmã do A. e mulher do dito Lopo Botelho, e a dita Dona Isabel Botelho, irmã do R. fizerão entre si concerto pelo qual a dita Dona Isabel houve as dezassete oliveiras, que erão bens livres, por estarem místicas a hum olival de morgado, e por ellas houve a dita Dona Maria huma vinha do morgado para a possuir em recompensa, como livre, e porém a R. demandando ao A. pela dita vinha, se lhe julgou por ser vinculada ao morgado, e assim lhe deve largar as ditas oliveiras com os fructos da indevida occupação, do mesmo modo que o A. foi condenado na dita vinha, visto não ter effeito o dito concerto, porque as possue, e o A. não ter notícia delle ao tempo da dita demanda, senão na instância de liquidação, onde não foi ouvido, e se lhe deixou para esta via seu direito reservado.

Defendese a R. com que a troca em que o A. se funda e confissão della feita pela dita sua irmã a fol. 10 não lhe dá direito a elle, nem a ella prejuízo, porque se fez com errada informação, porquanto o A. foi condenado na dita vinha, por se haver esta plantado em terras de olival de morgado, e não pela occasião da dita troca, pois se não fizerão partilhas, como o A. articula, em que cahisse o dito concerto, e dado que se fizesse, não podia valer sem Provisão de S. Alteza, ouvido o immediato successor do morgado, pelo que devia ser absoluta e o A. condemnado na damnificação de hum olival do morgado, que a R. possue, como herdeiro da mulher, e herdeira do dito Lopo Botelho, que o damnificou, e assim mais em 24 U. e 24 galinhas, que o A. cobrou indevidamente, porque arrematando os fructos de huma quinta da R. cobrou de mais o foro de 4 U. e 4 galinhas cada anno, que não entrarão na arrematação, e finalmente nas damnificaçoens, que tem feito na dita quinta, do tempo que a desfructa o que tudo se lhe pede por reconvenção. O que visto, com o mais dos autos, e disposição de Direito, e como se mostra provar o R. sua aução pela confissão do concerto articulado, feita pela mesma contrahente a fol. 10 e constar por informação, que se tomou na vistoria, que judicialmente se fez de que consta a fol. 67 a dita troca, com que se fica bem provando a posse da R. e direito do A. o qual se mostra ser condenado na vinha, que com effeito restituio a R. com que não prevalecendo o dito concerto por huma parte, como está julgado, não pode subsistir pela outra, e do mesmo modo, que o A. restituio a vinha, deve a R. restituir as oliveiras. Por tanto condeno a R. na restituição das ditas dezassete oliveiras com os fructos da indevida occupação até real entrega. E deferindo à reconvenção da R. vistos os autos, e como por elles se mostra que no appenso pedio a irmã R. esta mesma damnificação a fol. 336 que se refere à certidão de fol. 103 o que passou em cousa julgada, e como outrosim se mostra, que o foro de quatro milreis pedido pela R. foi juntamente arrematado com os fructos da quinta que o A. fez seus, e justamente os cobra, e as damnificaçoens da mesma quinta, além de que as jurão as testemunhas, defectuosas, não tem a R, por hora lugar de as pedir ao A. estando de posse delas pelo dito titulo da sua arrematação, cujo fim deve esperar, para lhas pedir, por não caber em reconvenção do líquido e incerto, e certo illiquido. Por tanto absolvo ao A. no pedido de reconvenção da R. a quem condenão nas custas dos autos. Lisboa, 10 de Junho de 1634. Gregório de Mattos, e Guerra.

 

NOTA: Esta sentença está repetida a pags. 443/444, do Vol. VII  dos COMMENTARIA AD ORDINATIONES REGNI PORTVGALLIAE, citado a seguir.

 

A qua sententia fuit appellatum ad Supplicationis Senatum, ubi fuit confirmata et fundata in deliberatione sequenti.

Judicis sententiam  in omnibus libenter amplector, L. cum precum Cod. de liberal. caus. Mascard. de probat. concl. 348 n. 48 Cald. forens. q. 31, n. 13. Thom. Vaz allegat. 72 num. 56. et in nostra hypothesi invenitur confessio Reae in articulis facta fol. 10, quae transactionem confitetur, et cum Actor fuisset condemnatus restituere Reae vineam acceptam ab ejus sorore virtute transactionis, ita etiam eodem modo, ac per consequens Rea tenetur demittere Actori olivetum acceptu ab ejus sorore virtute ipsiusmet transactionis, et nulla est melior probatio, quam proprii oris confessio, L. cum te Cod. de transact. Reynos. obs. 74 n. 1 et probatur etiam, quod olivetum postulatum accepit soror Reae virtute vineae ab ea dismissae sorori Actoris per laudatoris Reae, atque Actoris declarationem juratam fol. 67 et confessio facta in uno judicio, probat in alio, L. jubemus Cod. de liberal. caus. ad fin. Valasc. conf. 33 à n. 1, cum seqq.  et per declarationes factas in inventario fol. 11 aperte constat, quod olivetum est liberum sine onere, seu vinculo maioratus, quin obstare possit certitudo fol. 64 et adjudicatio in ea scripta, quia ibidem fol. 67 reperitur expressum, quod si per tempus futurum constiterit, quod sorori Actoris pertinebat aliquid in illa Villa ultra Bona maioratus, manebat jus suum illaesum, ut petere possit: ergo cum per declarationes in inventario positas, et per confessionem Reae, et ipsusmet laudatorem constet, quod contentionis olivetum est liberum sine vinculo maioratus, et quod soror Actoris illud demisit virtute vincae Reae judicatae, sine controversia est, quod illud restituere Rea Actoris sororis haeredi tenetur.

Igitur Judicem approbo in condemnatione Reae facta, et in absolutione reconventionis ex fundamentis ab eo erudite perpensis. Ulyssipone 30 Januarii 1675. Quifel.

Conveniunt Ribeiro, Cardoso.

 

E no dito feito está hum appenso com a sentença do theor seguinte:

 

Não defiro aos embargos fol. 529 offerecidos em nome de Dona Isabel Botelha contra a partilha, e divisão das terras, de que se trata, feita pelos louvados a prazimento das partes fol. 198 visto ter passado o termo da Ordenação dado para semelhantes embargos, e muito mais sem a embargante contradizer a divisão, antes tendo della noticia, a não contradisse, mas a approvou, fazendo os requerimentos, que correm a fol. 207 por diante sem falar em lesão alguma, que houvesse nesta divisão, antes consentio nella pedindo somente que se tratasse de se avaliarem humas benfeitorias, e damnificaçoens em comprimento de um Acórdão da Relação, o que se satisfez pelo despacho fol. 208 pelo que conforme a Ley do Reyno não podem ser admitidos agora os ditos embargos: e assim o julgo, e mando, que sem embargo deles, corra a causa seus termos, e a embargante pague as custas dos embargos.

Lisboa 23 de Junho de 1651. Doutor Basto.

 

A qua sententia fuit gravamen interpositum ad Supplicationis Senatum, ubi fuit lata sententia sequens

 

Acórdão os do Desembargo et c Não he aggravada a aggravante pelo Corregedor de Cível da Corte, cumprase sua sentença por seus fundamentos, e pelo mais dos autos, e condenão a aggravante nas custas delles, e lhe reservão seu direito, para que via ordinária possa tratar das propriedades, que entender, que são vinculadas ao morgado, de que he administradora, e se lhe não julgarão na divisão, de que se trata, na forma de seu protesto. Lisboa 9. de Novembro de 1652. Pereira. Salas.

 

Haec sententia fundata fuit in deliberationibus sequentibus.

Non solum post tempus à lege definitum laesio allegatur, ex quo pars audiri non debet, Ord. lib. 4. tit. 96 § 19 magis in specie Ord. lib. 3 tit. 17 § 5 Pin. 2. p. lib. 2 cap. 1, n. 3 Fachin. lib. 11 cont cap. 22 Valasc. de part. cap. 37 à n. 17. Sed neque in concludenti forma laesio allegatur, cum pars non articuletur, in quo laesa fuerit, id est in qua quantitate, an seilicet in sexta parte portionis sibi debitae, vel in dimidia, quod necessarium quoque erat ut obtinere valeat, nam generalis, et incerta laesionis allegatio prodesse non potest, argumento Ord. lib. 4 tit. 13 et tit. 96 § 18 et 19. faciunt quae Mascard concl. 586 numer. 14. Mantic. de contract. lib. 23 tit. 6 num. 28. Cabed. decif. 34, n. 20. p.1 . Unde ex una, et altera ratione per viam intentata laesionis impediens consequi nequit, sic confirmato dignissimo Praeside. Lisboa 3. de Setembro de 1652. Salas.

Convenio. Pereira.

Et quando à vendicante producitur instrumentum alienationis, sive concessionis obtentum à Principe supremo, seu ab ejus officialibus, tunc enim per ipsum dominium probatur ad omnes effectus, ut multis citatis tenet Pareja de instrum. edit. tit. 1 resol. 3 § 2 n. 91 et 96 et quare Noguerol. alleg. 26. n. 218 et diximus cum multis supra n. 174, 175 et 176.

Ideoque potest acquirens facultatem ad subrogationem eam facere, et dominiu probat ex rescripto contra possidentem bona data in locum maioratus, in quórum locum alia subrogata fuerunt, ut jam diximus, et judicatum fuit in causa seq. Ubi etiam ad alia.

   

 

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PEGAS, Manuel Álvares, 1635-1696

 

Título t. VII. COMMENTARIA AD ORDINATIONES REGNI PORTVGALLIAE. TOMVS SEPTIMVS. IN QUO AGITVR DE SENATVS AULICI POTESTATE CIRCA Orphanos, de facultate circa Concessionem veniae aetatis, emancipationisque, de provisionibus circa bonorum traditionem. De jurisdictione , obligatione Iudicum orphanorum, circa bonorum minorum administrationem , traditionem, inventarium, de quibus bonis fieri debeat , vel non , quomodo fieri debeat, quibus solemnitatibus, à quibus [...]sonis. De partitionibus, inventarii beneficio. De Patre legitimo administratore , de eius potestate , in quibus bonis habeat usum fruct[...], in quibus casibus ab illo privetur, mater, aut avus ob non confectionem inventarii [...]iuetur haereditate filii , aut nepotis. De materia bonorum occultatorum , de paena occultantis inventario. De educatione pupilllorum, apud quos fieri debeat. De alimentorum praestatione. De locatione operarum minor(ü). De eorum salariis. De expensarum taxatione. De minor(ü) matrimoniis. De paena inductio[...] matrimonia contrahenda. De orphanor(ü) bonis, quomodo, quando debeant locari, aut subhastari, quibus solemnitatibus, personis. De custodia bonorum. De tutorum, aut curatorum obligatione, cura, diligentia, culpa, neglig(ë)tia, tam circa administranda bona, quá emendas res, collocandas pecunias , exactionem debitorum , prohibitionem emendi , aut acquirendi res minorum per se, vel per interpositas personas. De salariis tutorum. De eorum, Iudicumque [...]deiussoribus. De quibus causis Iudices orphanorum cognoscant, inter quas personas. De officio Scribae Orphanorum, de eius obligatione. De curatoribus absentium , quando dentur, vel non, in quibus casibus , personis. De officio calculatoris, de eius obligatione circa salariorum , expensarumque calculationem , quibus personis , qua forma fieri debeat calculatio. De Aduocatorum salariis, quomodo , quando debeantur, calculari debeant , quâ forma, in quibus casibus. De Viatorum salariis. De aetate requisita ad judicandum in Iudicibus , Magistratibus. De matrimonio requisito in Iudicibus. De officiorum renuntiationibus , quando , in quibus casibus sit permissa , vel non. De obligatione Officialium circa exercenda per se officia , non per substitutos. Et de officiorum substitutis, de eorum provisione á Senatu Aulico , ad quem pertineant officia ex Principis concessione ; de facultate ad nominandum. De impetratione officiorum praeter delicta comissa ab officiali. De Principis regalia circa provisionem officiorum' , de eorum privatione ob delicta comissa absque forma judiciali. De suspensione officialium propter errores commissos in officiis ab officialibus, cum tanta Iurium , Doctorum allegatione, ut unaquaeque materia per se tractatum aequare possit. CUI ACCESSIT TRACTATUS De potestate Senatus Aulici, ejusque jurisdictione, gratiae litteris, Tribunalis praxi, ac monumentis, stylique opusculo. Ad intellectum Regiminis eiusdem Tribunalis.

 

1682

 

ULYSSIPONE, 1682

 

 

pp.294 a 296.

 

B.N. SC 5114- 27 A

 

 

Sentença de 2 de Novembro de 1671

 

No feito de Francisca Cado Beniqua, contra Martim Gonsalves do Souto e sua mulher Brittes Maria, Escrivão Vicente Lobato Quinteiro, se deu a sentença seguinte.

 

Vistos estes autos, et c. Mostrase por parte do A. que Francisco Fernandez Furna, já defunto, foi seu tutor, e como tal, no termo que fez a fol. 16, verso e 17, se obrigou à satisfaçam das legitimas, assim della A. como de seus irmãos. Mostrase que administrou a tutela, obrigando a ella seus bens, havidos e por haver. Pela qual obrigaçam tirou a A. carta de partilha, e sentença da quantia que pede. E tratando da execuçam della, por lhe não nomearem bens os filhos do dito tutor, sendo habilitados, se houve a execuçam por feita, e por tanto intenta esta auçam contra o R. Martim Gonsalves do Souto, terceiro possuidor dos bens do dito tutor: A qual auçam, diz procede contra elle; porque estando justificada a divida, e sendo os bens que arrematou, do tutor defunto, já do tempo que administrou a tutela, ficam provados os requisitos da hypothecaria, e procede de plano contra o R. porque a fazenda lhe passou com o seu encargo: Pelo que está obrigado , ou a pagar a dívida ou a largar a fazenda; por quanto suposto a possua por titulo de arremataçam, com tudo a divida e tudo o mais foi simulado, por ser o tutor defunto muito rico, homem de negocio e grosso trato, que não necessitava de dinheiro, em cujos termos havendo simulaçam entre o tio e o sobrinho, procede correntemente a auçam hypothecaria, sem embargo das contas, de que o R. se val, porque estas sam erradas, em razam de não haver feito com ella nenhuns gastos, nem poder fazer contrato com os menores seus irmãos, de quem he herdeira, por ser também seu tutor. Com o que deve ser condemnado na forma pedida no libello, vista a execussam dos bens, e os que o R. allega, serem intrincados, e sem efeito, nem valor. Por parte do R. se mostra, que sendo morador no Brasil, mandou ao defunto Francisco Fernandez Furna, seu tio, muita quantidade de fazendas, em Assucares, Tabacos e Letras, que importaram muito dinheiro, de que, e de dívidas, que por elle pagou, e gastos que fez por o ver alcançado, procedeu a divida, de que se trata, que se reduzio a escrituras: Em virtude das quaes se mostra, que o R. demandou ao dito Francisco Fernandez Furna, e alcançou sentença contra ele e lhe fez penhora nos bens , que possue; e feita arremataçam, tomou posse deles, com que ficou legitimo possuidor, e senhor dos ditos bens, e extinta qualquer hypotheca, que nelles houvesse na forma da Ordenaçam do Reino: Sendo que também esta se extinguio em razam de que o dito defunto não devia à A. cousa alguma, pois dando contas da tutoria judicialmente, sendo parte ouvida a mesma A. nellas, se abateram as dividas podres, e gastos que fez, e ficou devendo só , e liquidamente até o tal tempo 239332 reis. Como se vè das ditas contas julgadas por sentença e confirmadas em Relaçam, e que o dito alcance lhe foi pagando nos gastos de vinte milreis, que se  lhe arbitraram em cada anno, como depõem o Partidor Cipriano da Veiga a fol. 208. e outros mais: E que com esta despeza, e outras que fez com a A. no Salvador, e Recolhimento, lhe não ficou devendo cousa alguma, razam porque quando o dito tutor faleceo, sendo advertida a A. tratasse de cobrar, o que se lhe devia, ella confessou , que não era acredora. O que também se justifica com o transito do tempo, falta de bens da A. quantia grande e parentesco chegado, presunçoens exclusivas da divida, inductivas do pagamento. Mostrase mais por parte do R.  que he homem nobre, de verdade, e saã consciência, rico e abonado, Familiar do Santo Officio, muito lizo em seus negócios, e que com effeito, mandou as ditas fazendas, e que a divida he verdadeira, e que a elle lhe pertencem os bens arrematados, pois com o sobredito está excluída a presunçam de simulaçam, que não houve, e que não se provando esta, se não prezume de Direito, antes em duvida sempre se devia fazer interpretaçam exclusiva della: Com o que deve ser absoluto em taes termos. Mayormente não havendo excussam legitima e mostrando o R. bens pertencentes ao defunto, caso em que a auçam hypothecaria não pode ter procedimento, ainda que no presente tivera lugar. O que tudo visto, e o mais dos autos, e disposiçam de Direito, segundo o qual a A. não prova os requisitos, que nelle se requerem, para ter lugar a auçam hypothecaria, por quanto ainda que mostre a sentença da partilha do Appenso, esta não comprehende ao terceiro, e posto que o comprehendera, não se justifica a divida della, pois intentando esta auçam pela divida, que diz, lhe ficou devendo seu tutor, a tal divida não existe; porque dando elle contas da tutoria no Juízo dos Órfãos, aonde tocava, abatidas as dividas podres, e despezas que fez, ficou devendo liquidamente 239232 reis. E vindo a A. com embargos às ditas contas, como se vè a fol. 121 que julgaram por não provados, e as contas por boas, como parece da sentença a fol. 127 verso confirmada no Supremo Senado a fol. 120, a qual passou em cousa julgada: De modo que, ainda que procedera tudo, o que a A allega contra ella, neste Juízo se não pode tomar conhecimento, e com a dita sentença e arbitramento, que testemunha de facto próprio, fazerselhe cada anno o Partidor Cipriano da Veiga, que o defunto satisfazia com os mais gastos, que com a A. fez, e com a advertência que se prova fazerselhe ao tempo da morte do defunto, de que não usou, dizendo,lhe não era devedor, e com o parentesco, transito do tempo, necessidade da A. e grandeza da divida, se prezume estar de todo paga, conforme as resoluçoens dos D.D. com o que vem a faltar a A. na justificaçam do principal requisito, que he a justificaçam da divida, para ter lugar a hypothecaria,  que também cessava no caso presente; porque sendo o R. acredor verdadeiro , das quantias que pedio ao defunto, e alcançando contra elle sentença, fazendo penhora e arremataçam, tomando posse real e corporal, acquirio verdadeiro domínio nos ditos bens e se extinguio a hypotheca na forma da Ley do Reyno, e do que se julgou na sentença do Senado em caso semelhante: Como se vè das palavras que vam insertas na do Juiz dos Orfãos folhas 299, confirmada a fol. 305. E assim ficou seguro o R. arrematante, para não ser mais molestado sobre os bens arrematados: E também porque em caso que faltara esta extinçam da hypotheca, faltou a A. na justificaçam  do outro requisito de estarem excutidos os bens do defunto, que requere a Ley; por quanto o R. mostra ficarem algumas auções de importância, como he a da certidam fol. 240 que he liquida, e corrente, por ser a conta a fol. 244 feita em virtude de huma sentença do Supremo Senado, e importa a quantia de dez mil Cruzados e sessenta e sete mil reis, e a allegaçam de existir pòde o R. agora fazer assim pela reserva, que lhe deixou o Senado a fol. 56 como por nam haver sentença declaratória de excussam, citado o terceiro: e dado que a houvera, tanto que o terceiro mostra bens,  sempre pode oppor, que não está a excussam feita; por quanto conforme às resoluçoens dos D.D. nunca a sentença de excussam passa em cousa julgada, e he matéria que sempre se pode oppor e allegar, ainda depois da lide contestada. E como por parte da A. se não impugna esta divida, nem a simulaçam que allega, se presuma, nem prove, ou a causa para ella, nem o parentesco, conforme a melhor opiniam seja bastante, para  a induzir, mayormente contra o R. que prova ser de verdade, e que a duvida he verdadeira, e o de que procedeo, e isto por testemunhas mayores de toda a exceiçam, que tem inteiro credito: E visto outrosim como à A. não pertencem as legitimas de seus irmãos Religiosos, mas só ao Convento, e pelas escrituras que a mesma A. apresentou, se mostra, que foram vendidas e renunciadas pelo mesmo Convento, que o podia fazer, e o defunto aceitar, por não ser o contrato com os menores, se não com o Convento, que não tinha prohibiçam para contratar: Por tanto absolvo o R. do pedido pela A. A qual condemno nas custas dos autos. Lisboa, 2 de Novembro de 1671. Gregório de Mattos & Guerra.

 

A qua sententia cum appellaretur, lata fuit sequens.

 

Acordam os do Desembargo, et c. Bem julgado he pelo Juiz, em absolver ao R. da restituiçam das legitimas pertencentes aos dous Religiosos, irmãos da A. Porèm em o absolver também do mais que se contem na auçam intentada, não he por elle bem julgado: Revogando nessa parte sua sentença, cumprase o confirmado por alguns de seus fundamentos e o mais dos autos: Os quaes vistos, e como por elles se mostra, haverse feito entrega da legitima da appellante a seu tutor Francisco Fernandes Furna, que a não entregou acabada a sua tutoria, nem no discurso do tempo que viveo, nem ao depois seus filhos, que foram habilitados, e julgados como excutidos, por não possuírem bens alguns do dito seu pay defunto, termos em que conforme a Direito compete à appellante a auçam hypothecaria contra o appellado, que pela arremataçam que fez, he ao presente possuidor dos bens, que ficaram do dito tutor, os quaes legal e convencionalmente estavam obrigados à restituiçam pedida, e com este encargo passaram ao R. arrematante: E como outrosim se mostra ficar alcançado nas contas que deu, em 239332 reis, de que até ao presente não está satisfeita a A. e haverlhe deixado seiscentos mil reis, e se entender por suficientes presunçoens, que detes autos resultam, que esta quantia foi mais deixada por satisfaçam, do que nem pagou, sendo tutor, do que por titulo de legado, e ficar por esta razam competindo à A.  a auçam intentada igualmente pela dita summa: Condemnão ao appellado, que pague à dita A. os 239332 reis, com os reditos a cinco por cento em cada hum anno até real entrega. E se fará a conta delles depois de passados os primeiros dous annos, em que Francisco Fernandes Furna entrou na administraçam da tutoria: E do mesmo modo pague os seiscentos mil reis declarados no Codicillo, com os rendimentos a cinco por cento da lide contestada por diante, atè a appellante ser inteiramente paga, e satisfeita das ditas quantias na forma referida. E pague o appellado as custas dos autos. Lisboa, 27 de Junho de 1674. Vellez. Ribeiro. Cardoso. Com tençam do Doutor João de Gouvea da Rocha.

 

Haec sententia fundata fuit in deliberationibus sequentibus.

Contendit Actrix appellans adversus Reum possidentem bona sui tutoris debitoris, ut ei solvat debitum deductum in libello, et agit actione hypothecaria, excussis prius haeredibus filiis ipsius tutoris: Et quamvis Doctus Judex duplicatis fundamentis contrarium definivit fol. 454. Reum ab actione absolvens, aliter judicandum existimo.

 

 

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Emanuellis Alvarez Pegas (Manoel Alvarez Pegas), Commentaria ad Ordinationes Regni Portugalliae , Ulyssipone, 1682. Tomus Septimus, pp.638 a 643.

 

B.N. SC 5114- 27 A

 

Utrum Senatus Aulicus possit concedere facultates ad hoc ut domini domorum cogantur vendere eas Monialibus, aut Religiosis ad constructionem, vel ampliationem Monasterii? Et si negetur, an possint Judicio ordinario per actionis viam eos ad vendendum contra suam voluntatem obligare? Et quid ob publicam utilitatem?

 

Licet nemo invitus possit cogi ad vendendam ream suam, L. invitum I 1. Cod. Contrab. empt. Ubi multos refert August. Barb. in Collect. Ordinat. lib. 4. tit. 11. Et tenent statim citandi. Attamen ob publicam utilitatem, favoremque Religionis, potest dominus cogi per viam Provisionis Regiae concessae a Senatu Aulico, ut fieri solet, ad vendendam ream suam, soluta aestimatione, quoties Religiosis, aut Monialibus, aut operi publico necessaria fuerit domus pro ampliatione, constructioneve Monasterii, soluta aestimatione, prout testatur Cabed. Valasc. Barb. et alii, quos ego ipse refero in Comment. ad Orden. tom. 2, pag. 199. num. 4  De qua materia ad varias quaestiones ultra citatos vide Barb. in d. L. invitum et Pater ad d. Ord. tit. 11, Costa conf. 28 Valenz. conf. 18 Cutel. de donat. discurs. 2 part. 6 num. 50 Marant. 3 p. respons. 21 alias 31.

Et si Senatus Aulicus negaverit dictam facultatem petitam, potest Monasterium via ordinaria dominum cogi ut judicatum fuit in causa sequenti.

No feito da Abbadessa e mais Religiosas do Convento de Santa Anna contra os Irmãos, e mais Officiaes da Confraria da mesma Santa, Escrivão das Appellaçoens Francisco Correa de Brito, se deu a sentença do theor seguinte:

 

Duce Domino.

Vistos estes autos, et c. Mostra-se por parte das AA. que o Mosteiro de Santa Anna, sitio extra muros desta Cidade, he do Padroado Real, pelo haver fundado a Senhora Rainha Dona Catharina. e haver nelle vinte e dous lugares da apresentação dos Senhores Reys de Portugal. E para effeyto da dita fundação, mandou a dita Senhora Rainha tomar posse de huma Ermida da invocação de Santa Anna, que naquelle tempo era limitada, e que por ser a dita Ermida dos Sapateyros da Padaria, havendo elle embargado a dita posse, fizèrão Cabido e se resolvèrão a disistir dos ditos embargos, por não litigarem com a dita Senhora, e a fazerem concerto com as Penitentes de Santo Agustinho, a cujo favor se tomara a dita posse, e que com effeyto o fizèrão sendo jurado. Para o que se houve Provisão Real. E he o que vem na Escritura a fol. 7 vers. Porèm que ellas AA. não estão obrigadas ao dito pacto, e juramento feyto pelas ditas Penitentes de Santo Agustinho, por serem Religiosas  da Ordem  de S. Francisco, debaixo de cuja Regra militão há mais de cem annos, estando à obediência de seus Prelados, com os quaes, nem com ellas AA. o dito contrato se outorgou: mayormente quando o caso, de que se trata, não he compreendido na dita Escritura; por quanto ellas AA. são em numero ao presente mais de cento e vinte Religiosas, e perto de trezentas pessoas com as serventes, e educandas, e assim tem necessidade de se alargar, para effeyto de poderem assistir no Coro aos Officios Divinos, Oração e Penitencia, o que não podem fazer na limitação, e estreyteza, em que estão. E muytas vezes deyxão de ouvir todas Missa, sendo disso causa os RR. Por quanto provão que os RR. se fazem senhores da dita Igreja tão absolutamente, que tem as chaves da porta principal, e travessa, e ainda da Sacristia, e Tribuna, e a abrem de noite, e de dia, e todas as vezes que lhes parecer, fazendo dentro da Igreja vigílias de noyte, onde introduzem bayles, e cantos profanos, e irreverentes ao lugar sagrado, desenquietando o sossego, e oração das AA. Que na dia Igreja há dous Sacrários, hum das AA. e outro da Freguezia, e corre risco de succeder com o Sacramento um caso execrando, de que Deus nos livre, por terem os RR. as ditas chaves, e as fiarem talvez de hum rapaz, como jà succedeo, que se achou dormindo à porta da Igreja com as ditas chaves nas mãos: Que outrosim não consentem que as AA. fação festa aos Santos, nem para isso se ornem as paredes, e Altares sem lhes darem expressa licença. E são nisso tão bárbaros, que jà succedeo subirem sobre o Altar mor, e desarmarem o ornato de uns volantes, que estavão para huma festividade, com o motivo de não haverem as AA. pedido licença: Que outrosim tem os RR. uma casa sobre a Sacristia, e sendo que se declarou no contrato, que lhes ficaria para a fabrica da Igreja, usão della com alteração, porque nella tem um Capellão Clérigo com risco da clausura das AA. por quanto a dita casa està encostada na mesma parede do Convento. E sendo em tempo do Capellão o Padre António da Cruz, lhe fugio huma sua sobrinha pelos telhados, e se recolheo no dito Convento: E que sendo os RR. obrigados a fabricar, e ornamentar a dita Igreja, dando todos os guizamentos necessários, a tudo faltão, e as AA. tem supprido da sua fazenda há mais de cem annos a esta parte: E que sendo o chão da Coro debayxo das AA. que o fizèrão alargando, e acrescentando a dita Igreja, e fazendo a portada, os RR. sem titulo se empossárão delle, e lhe mudàrão huma porta travessa, e recebem a fabrica do dito chão: Pelo que concluem, que os RR. faltam ao contrato, à reverencia que se deve ao Templo, com prejuízo do Convento, e damno das AA. E visto como não estão obrigadas ao contrato, que não fizeram, tratando, como tratão ex nova causa, e com necessidade, que lhes sobreveio, lhes não obsta o juramento, mayhormente estando, como està relaxado: E que entre os priviliegios, que de direyto são concedidos às Igrejas, e Religioens, he serem obrigados os donos dos bens, e direytos, a vendellos para a utilidade , comodidade e bem das ditas Religioens ? não só para a edificação, mas também para a ampliação, e extenção: E assim q devem os RR. ser condemnados a pagar os gastos referidos, largando o dito chão, e fabrica delles. E finalmente a vender às AA a parte, e direyto que tem na dita Igreja, e casas, em que assiste o dito Capellão, avaliando-se e estimando-se o valor de huma, e outra cousa por louvados, que as AA. se offerecem logo a pagar, para que ficando senhoras de toda a Igreja, e casa, se possão alargar, e fazer mais capaz o dito Coro, e Igreja, e assim acudirem a suas obrigaçoens. Os RR. se defendem com a matéria de sua contrariedade a fol. 63. E mostrão, que D. Aleyxo de Menezes era senhor do chão em que hora està situada a dita Igreja de Santa Anna, e de outros adjacentes,  e delles fez irrevogável doação aos e  RR. assim fabricarão a dita Ermida à sua custa, e della forão senhores do anno de 1543 até o de 1561 em que a Rainha Dona Catharina mandou tomar a dita posse; porèm que a tal posse ** foi espoliativa, e della desistirão as Penitentes, a cujo favor se tomou pela dita escritura a fol. 7 vers. Em virtude de cujo contrato se ficarão os RR. conservãndo em sua posse antiga, e por elle estão as AA. obrigadas, por serem successoras das ditas Penitentes: E que por ser contrato jurado, tem ellas incorrido na pena de perjuras, que lhe pedem por reconvenção, sem embargo da relaxação,  que lhes não prejudica a elles RR. por não haverem sido partes na concessam della: E que alem da firmeza do dito contrato, se corroborou mais com a Bulla Apostólica, que se sentenciou a fol. 50 com penas de excommunhão, e comdemnação de mil cruzados, que pedem outrosim às AA. por reconvenção, visto haverem hido contra o dito cõtrato: E demais que as AA. fizeram este mesmo requerimento, e litígio aos RR. no Desembargo do Paço, onde saíram escusadas: E assim se não pode falar na matéria, por lhe obstar a exceiçam de cousa julgada: Mayormente ceßando os fundamentos, e nova causa das AA. Por quanto o ser o Coro pequeno, e incapaz do numero das AA. não tira a observância do dito contrato jurado, sendo que he grande, e bastante, e alem deße tem as AA. outro Coro inferior na Capella mòr, capaz de toda a Communidade: E que he menos sufficiente o outro fundamento, de que os RR. não consentem ornar a Igreja para as festividades sem sua licença; por quanto isso fazem licitamente, e o pòdem fazer de Direito; pois sam senhores absolutos da dita Igreja: E porèm que se as AA. lhe pedem as ditas licenças, elles RR. lhas não denegão. E quanto a lhe desarmarem os Altares com a irreverência articulada pelas AA. passa pelo contrario: E que outrosim de Direito podem elles RR. ter as chaves da dita Igreja como sua, e nessa forma ficou declarado na dita escritura: E quãto ò risco, que nenhum corre, pois os RR. as resguardão com o mesmo cuidado que podem ter as AA. e o Cura da dita Igreja:  E que elles RR. não fazem os bayles, e cantos indecentes, que as AA. articularam, e somente assistem de noite na dita Igreja na festa de Santa Anna, por guardar a prata e mais ornamentos, que levão para a dita celebridade. E se cantão, he com muita decência, e não no corpo da Igreja, senão dentro da Sacristia: E que na casa que tem sobre ella, supposto na escritura se reservou para a fabrica, licitamente tem elles RR. o seu Capellão, que he um Clérigo de authoridade, e boa vida, com que não corre perigo a clausura, sendo como he encostada a huma parede muy larga, e alta: E que outrosim tem licitamente a chave da Tribuna, por ser sua, e a fazerem a sua custa: Que acodem com todas suas obrigações na fabrica,  e ornamentos da Igreja, e se faltam, he às Missas, que muitos Clérigos nella dizem, e à alternativa das AA. a que elles não estão obrigados: E q o Coro, e portada da dita Igreja he delles RR. por quanto todo aquelle chão fora do dito D. Aleixo, q lho doou: E quãdo as Penitentes se encostarão à dita Igreja, fazendo o Mosteiro,  jà então era da mesma capacidade, e grandeza, que hoje he: Pelo que devião ser absolutos. O que tudo visto, e o mais dos autos, e disposição de Direito, e como se mostra, que toda a matéria articulada no libello das AA. que consiste em facto, provão ellas concludentissimamente, a saber, serem Freyras da Ordem de S. Francisco, perto de trezentas peßoas em numero, estreiteza do Convento, e todas as mais demasias, excessos e barbaridades dos RR. com que sobrevindolhe nova causa, e sendolhes relaxado o juramento, podem de Direito mover, como movem, a causa presente aos RR. E visto outrosim como supposto mostrão os RR. e não negão as AA. que a Ermida de Santa Anna he própria dos RR. desde o anno de 1543 atè que della tomou posse a dita Rainha, e de que as ditas Penitentes desistirão, todavia se mostra nestes autos a fol. 154, 155 e vers., que as AA, acrescentarão a dita Igreja, Coro, e portada, fazendo todo à sua custa. O que se comprova por evidencia, e vista de olhos, supposta a forma presente do dito edifício, que no tempo da Ermida não era possível, que tivesse tal forma. Com que se fica mostrando, que a dita Igreja de hoje commua dos AA. e dos RR. sendo conforme o Direyto, que os RR. são obrigados a vender às AA. a dita sua Ermida, pela necessidade que mostrão de se estender, e alargar. Com muyta mais razão os obriga elle Direyto no caso presente, em que as AA. são senhoras de parte da dita Igreja, pela edificarem, e acrescentarem em chão seu, que os RR. venderão, como se mostra da escritura fol. 7 vers. fol 14 e 145. E em que outrosim nenhuma connexão, nem compatibilidade podem ter as AA. com os RR. sendo senhores promiscuamente da dita Igreja huns, e outros; por quanto as AA. são Religiosas, que necessitão da sua clausura, quietação e socego, para os Officios Divinos, Oração e penitencia: E os RR. se mostra, que por serem officiaes Çapateyros, homens de ordinário rudes, incultos, e barbaros , cometem os erros, e insolências contra elles provadas, de fazer bayles profanos, discantes e sonadas irreverentes na dita Igreja, onde comem, e bebem: E de não consentirem, que as AA. celebrem as festas dos Santos sem sua licença, nem que ornem os Altares, e paredes, por cuja causa se prova, que chegàrão a tal demanda, q lançaram abayxo o ornato do Altar mòr, sendo que ao domínio dos RR. não prejudicão as ditas festas, e ornatos, e o fazem de teymosos, e irracionaes. E visto outrosim como se prova que os RR. não satisfazem com beneficiar e ornamentar a dita Igreja com todos os guizamentos necessários, sendo a isso obrigados pela dita escritura fol. 7 vers. em que se mostra tomarem esse encargo sobre si, de tal maneyra, que só na Missa alternativa das AA. ficàrão ellas obrigadas à dita Missa, e offerta de cera: E se mostra, que as AA. de muytos annos a esta parte acodem com os ditos guizamentos, gastando dos próprios do dito Convento, e suas Religiosas, E como outrosim reservando-se na dita escritura huma casa sobre a dita Sacristia para a fabrica, os RR. alterando o contrato, usão della com a moradia, e vivenda do seu Capellão, de que corre perigo à clausura das AA, como suecedeo no tempo do dito Capellão, o Padre António da Cruz, razoens todas de facto, e de Direyto, que bastão a serem os RR. obrigados a vender às AA. a parte, que tem na dita Igreja: Por tanto, visto como não obstão os fundamentos dos RR. por não estarem as AA. adstrictas ao juramento do contracto, em razão de que succedendo no Mosteyro das Penitentes, succedèrão na Regra, e Profissão, e se entende que as Penitentes se extinguirão, e de novo se criarão as AA. Além de que o dito juramento està relaxado pela Bulla fol. 24. E o caso presente da venda não he comprehendido na dita escritura; e postoque o fosse, as AA. litigão ex nova causa, e necessidade superveniente, e pela alteração, e ruim cumprimento dos RR, que tudo provão as AA. E o despacho dado no Desembargo do Paço não induz exceyção de cousa julgada, nem o recurso ao Príncipe impede o ordinário, e contencioso; e os RR. não provão as matérias de facto contehudas nos seus artigos. Porque alèm do que as suas testemunhas jurão sobre huma negativa, são todas homens Çapateyros, Irmãos desta Irmandade, e jurão em causa própria, com que não fazem prova. E pelo contrario as AA. a fizèrão legitima, e efficaz; Condemno aos RR. larguem às AA. a parte da Igreja, que se mostra edificarem, e acrescentarem a dita Ermida, que se liquidarà, e medirà por louvados, pessoas intelligentes no officio de Pedreyro, e Carpinteyro, e outras antigas, que informem do dito acrescentamento; e lhe paguem a fábrica, que atègora tem levado da dita parte das AA. que também se liquidarà: E que outrosim lhe paguem os gastos, que tem feyto no ornamentar da dita Igreja, a que os RR. são obrigados, excepto a Missa da alternativa, e offerta de cera, a que são tão sómente obrigadas as AA. O que outrosim se liquidarà. E condemno mais aos RR. a vender às AA. aquella parte, que tem, de que são senhores na dita Igreja, estimando-se, e avaliando-se por louvados, que para isso se tomarão por huma, e outra parte, e a dita casa sobre a Sacristia, e em fim toda aquella pertença, e direyto, que tiverem na dita Igreja, para do procedido fabricarem outra Ermida fora da Comunidade, e clausura das AA. ou fazerem o que melhor lhes parecer: E nas custas destes autos, em que mais os condemno. Lisboa, 20 de Dezembro de 1672.

Gregório de Mattos & Guerra.

 

** Na edição de 1682, falta a pág. 640 e está repetida a pág. 639. A pág. 640 foi reproduzida da edição de 1669 (1.º volume).

 

A qua sententia cum apellaretur, lata fuit sequens.

 

Acórdão os do Desembargo, et c.  Bem julgado he pelo Juiz, deferindo à aução offerecida no libello das AA. em condemnar os RR. a que larguem a casa, q tem sobre a Sacristia, e casas, em que vive o Capellão, e pertencem aos ditos Reos, e em não condemnar as appelladas: mas em condemnar os ditos Reos a que larguem e restituão às Authoras a parte, que edificarão, acrescentando a Ermida de Santa Anna, pagandolhe a fabrica, que até o presente tem levado da parte accrescentada, e os gastos, que as Authoras tem feito nos ornamentos da Igreja, e que sejão os Reos obrigados a venderlhe a parte, que nella tem, com as mais pertenças, e direyto na forma declarada pelo dito Juiz, não foy por elle bem julgado: Revogando nesta parte sua sentença por alguns dos seus fundamentos, e o mais dos autos: E como por elles se mostre terem os RR. a posse, e domínio da parte acrescentada na Igreja, como se vè pelos documentos juntos fol. 188, 196 e 198. E das testemunhas que jurão no acabamento da Contrariedade a fol. 107. E não mostrarem as Authoras o contrario por prova concludente, e assim na forma de Direyto deverem ser os appellantes absolutos da restituição da parte da Igreja, e fabrica, que tem levado, pedida pelas appelladas: E como outrosim se mostre não serem os Reos obrigados a dar ornamentos, mais que para as Missas, e Officios da sua Confraria, e assim não ter lugar a repetição dos ornamentos jà intentada pelas Authoras. E se mostre também, que os Reos são padroeiros da dita Igreja, termos em que não podem ser constrangidos a vender o seu domínio, e pertenças delle, sem preceder Provisão Real, e não terem as ditas Authoras precizão, e moral necessidade do domínio, que pretendem; e faltando esta, não poderem os Reos judicialmente ser obrigados a vender o Padroado, que na Igreja tem; principalmente tendo as appelladas de facto, e de Direyto o uso da Igreja, para celebrarem , e ouvirem os Officios divinos, e assistirem às obrigaçoens do seu instituto Religioso, sem lhes ser impedido pelos appellantes: E como finalmente se mostre pelas appelladas, e constou pela vistoria, que se fez, ser o seu Convento muito limitado, para nelle se acommodar o grande numero de Religiosas, Porcionistas, e serventes, que de presente tem, e não poderem todas ouvir os Divinos Officios com atenção devida, por respeito da limitação dos Coros situados sobre a porta principal, e Capella mòr, de que resulta necessidade evidente de serem ampliados os ditos Coros, e Convento; de q resultarà commodidade grande espiritual, e quietação às Authoras, sem serem perturbadas nas horas de suas oraçoens, e sem risco à clausura do Mosteyro,  unindo-se as casas do Capellão, e a que està sobre a Sacristia à parte mais contigua do Convento. E de as largarem os Reos, lhes não pòde acontecer prejuízo considerável; por quanto ficão sem lezão no seu Padroado, e concorrendo o favor da Religião e causa pia, e necessidade superveniente, devem os Reos ser obrigados a largar as ditas casas, e consentirem na ampliação dos Coros. O que tudo visto, e o mais dos autos, absolvem aos appelantes da restituição da parte da Igreja, e fabrica pedida, e declaram não ser obrigados a dar ornamentos, nem à venda do domínio, e Padroado, que os Reos tem na Igreja pelo discurso de tantos annos. E por se evitarem duvidas, que poderá haver sobre a concessão das licenças, que as Authoras pedem à Confraria para ornarem a Igreja nas festas occurrentes, e que fazem para se celebrarem com mayor decência, e luzimento, e para conservação do Padroado dos Reos, baste pedirselhe em cada hum anno licença geral para armarem a Igreja nas celebridades festivaes, que nelle occorrem: Mandão, que na primeyra licença, que as appelladas pedirem no principio de cada hum anno seja geral sua concessão dada pelos Reos, e que eles larguem as casas sobre a Sacristia, e em que vive o Capellão: Com declaração, que fazendo as Authoras as obras, de que necessitão, deyxarão lugar conveniente para Sacristia, e guarda dos ornamentos pertencentes à Confraria dos appellantes, aos quais serão obrigadas as appelladas pagar o valor das casas, em que morava o Capellão, ou comprar outras equivalentes, e próximas à dita Igreja e ficarà na eleyção dos Reos escolherem as casas, que as Authoras derem, ou a estimação das casas, que se lhe largão. A qual se fará por louvados escolhidos por estas partes. As quaes condemnão nas custas dos autos de permeyo. Lisboa, 5. de Abril de 1674. Cardoso, Ribeyro, Leytão.

 

Haec sententia fundata fuit in deliberationibus sequentibus.

 

14-10-2008 - Encontrei agora mais duas sentenças de Gregório de Mattos Guerra, no livro:

TRACTATUS DE EXCLUSIONE, INCLUSIONE, SUCCESSIONE, ERECTIONE MAIORATUS, 5 volumes, S.C. 782 V a S.C. 786 V.

Pars tertia – Pags. 186 a 189 – Lisboa, 18 de Agosto de 603 (erro por 1673)

Online: http://books.google.com

 

Pars quinta – Pags. 12 a 15 – Lisboa, 16 de Abril de 1674.

Online: http://bdigital.sib.uc.pt/bduc/Biblioteca_Digital_UCFD/digicult/UCFD-H-D-19-3_5/globalItems.html